O Bobo - Cap. 6: VI - Como de um homenzinho se faz um homenzarão Pág. 55 / 191

Neste momento um vulto apareceu no limiar da porta entreaberta por onde os dois haviam entrado. Era o bufão, que olhava fito para o Sol que se punha, fazendo-lhe visagens e cantarolando sem reparar nos cavaleiros:

Tu vais-te: mas voltas.
E eles ir-se-ão
E não voltarão.
Froilaz ou Froilão;
Fernando de Trava,
E o seu valentão,
Dom Bulrão,
D’Aragão,
Que de Dulce,
Bela Dulce,
Quer a mão...
Diabo!. . .

Engolfado na sua trova, Dom Bibas, a quem algum génio avesso impelira a escoar-se pelo corredor escuro e a entrar no jardim, voltara de repente a cara e dera ao pé de si com os dois cavaleiros que o escutavam.

– Que dizias tu de Dulce, bufão? – perguntou o conde com gesto severo e lançando de relance os olhos para Garcia Bermudes.

O bobo leu no aspecto de Fernando Peres que se achava num daqueles trances arriscados, em que as suas injúrias em vez de aplausos só lhe acarretavam maus tratos. Todavia o dito estava dito. Pôs-se a mirar os balegões dos cavaleiros: eram de pele de gamo e de sola delgada, revirados na ponta em compridos bicos, segundo a moda do tempo. Fez rapidamente o seguinte dilema: ou a extrema ousadia me salva, ou o que já disse me perde. Em todo o caso, preso por mil, preso por mil e quinhentas. Avante! E fazendo uma profunda cortesia respondeu:

– Dizia esta humilde criatura que vós, mui nobre D. Garcia, sois parvo em perseguir com vossos ridículos amores a minha boa Dulce; e que vós, senhor conde de Galiza, nos faríeis especial mercê em irdes visitar as corujas do vosso castelo de Faro...





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