O alferes-mor, porém, a fez sair daquele estado violento.
– Não – disse ele aproximando-se de Dulce –, não serás minha vítima! Garcia Bermudes nunca se esquecerá do dever de cavaleiro. Seria acaso a minha vida mais risonha possuindo-te, quando o teu coração... me rejeita? Sê livre! Recuso a posse de Dulce, rainha de Portugal!
A pobre donzela largou os vestidos de D. Teresa, e pegando na mão do cavaleiro beijou-a soluçando!
– Eu te amarei como um irmão! – exclamou ela. – Eu te adorarei como um deus. Oh! tu sabes que só assim...
– Silêncio!... – interrompeu nobremente o cavaleiro: porque percebeu que Dulce na agitação em que se achava ia trair-se a si própria e revelar o seu segredo.
O conde continuava a contemplar esta cena com os braços cruzados e com um riso cruel nos lábios. Dirigindo-se então à rainha, prosseguiu no mesmo tom de ironia amarga:
– Bem se vê, senhora, que o vosso alferes-mor foi armado cavaleiro pelo Cid Rui Dias. Guarda puras as tradições daquele espelho brilhante de todas as cavalarias. Mas eu fraco mortal, que não ponho tão alto a mira, penso mais tranquilamente! Garcia Bermudes! Dulce! Escutai o que vos digo: são as minhas derradeiras palavras. Amanhã a estas horas o alferes-mor de Portugal terá uma esposa, e esta esposa será a nobre e rica herdeira dos Bravais.
E voltando-se para D. Teresa ajoelhou, beijou-lhe a mão, e disse:
– Espero que a mui excelente rainha, no momento em que vai recolher-se à sua câmara, permitirá que o mais leal dos seus vassalos se retire também para não perturbar os colóquios de dois amantes na véspera do seu noivado.
A inflexão que o conde dera a estas últimas frases tinha o que quer que era atroz e diabólico. D. Teresa estremeceu como sacudida por uma corrente eléctrica e, atravessando vagarosamente a sala, desapareceu.