– Ámen – acrescentou o ferrador. – Então que arranjo é este de casa? Que breca de tarimba é esta?! Quer-se aqui uma cama de gente, e alguma coisa em que um cristão se possa sentar.
– Isto assim está excelente.
– Bem vejo… E de barriga? Como vamos nós de trincadeira?
– Ainda tenho dinheiro, meu amigo.
– Há-de ter muito, não tem dúvida: mas eu tenho mais, e vossa senhoria tem ordem franca. Veja lá esse papel.
Simão leu uma carta de D. Rita Preciosa, escrita ao ferrador, em que o autorizava a socorrer seu filho com as necessárias despesas, prontificando-se a pagar todas as ordens que lhe fossem apresentadas com a sua assinatura.
– É justo – disse Simão, restituindo a carta –, porque eu devo ter uma legítima.
– Então já vê que não tem mais que pedir por boca. Eu vou comprar-lhe arranjos…
– Abra-me o seu nobre coração para outro serviço mais valioso – atalhou o preso.
– Diga lá, fidalgo. Simão pediu-lhe a entrega de uma carta em Monchique a Teresa de Albuquerque.
– O Berzabum parece-me que as arma! – disse o ferrador. – Venha de lá a carta. O pai dela está cá. Já sabia?
– Não.
– Pois está; e, se o Diabo o traz à minha beira, não sei se lhe darei com a cabeça numa esquina. Já me lembrou de o esperar no caminho e pendurá-lo pelo gasnete no galho dum sobreiro… A carta tem resposta?
– Se lha derem, meu bom amigo.
Chegou o ferrador a Monchique, a tempo que um oficial de justiça, dois médicos e Tadeu de Albuquerque entravam no pátio do convento.
Falou o aguazil à prelada, exigindo, em nome do juiz de fora, que dois médicos entrassem no convento a examinar a doente
D. Teresa Clementina de Albuquerque, a requerimento de seu pai.
Perguntou a prelada aos médicos se eles tinham a necessária licença eclesiástica para entrarem em Monchique. À resposta negativa redarguiu a abadessa que as portas do convento não se abriam. Disseram os médicos a Tadeu de Albuquerque que era aquele o estilo dos mosteiros, e não houve que redarguir à rigorosa prelada.
Saíram, e o ferrador só então reflectiu no modo de entregar a carta.