Mariana estava ali; ouvira a confidência, e achara acertada a opinião de seu pai. Vendo, porém, a impaciência do hóspede, pediu licença para falar onde não era chamada, e disse:
– Se o senhor Simão quer, eu vou à cidade, e procuro no convento a Brito, que é uma rapariga minha conhecida, moça duma freira, e dou-lhe uma carta sua para entregar à fidalga.
– Isso é possível, Mariana? – exclamou Simão, a ponto de abraçar a moça.
– Pois então! – disse o ferrador. – O que pode fazer-se, faz-se. Vai-te vestir, rapariga, que eu vou botar o albardão à égua.
Simão sentou-se a escrever. Tão embaralhadas lhe acudiam as ideias, que não atinava a formar o desígnio mais proveitoso à situação de ambos. Ao cabo de longa vacilação, disse a Teresa que fugisse, à hora do dia, quando a porta estivesse aberta, ou violentasse a porteira a abrir-lha. Dizia-lhe que marcasse ela a hora do dia seguinte em que ele a devia esperar com cavalgaduras para a fuga. Em recurso extremo, prometia assaltar com homens armados
o mosteiro, ou incendiá-lo para se abrirem as portas. Este programa era o mais parecido com o espírito do académico. Em vivo fogo ardia aquela pobre cabeça! Fechada a carta, começou a passear em torcicolos, como se obedecesse a desencontrados impulsos. Encravava as unhas na cabeça, e arrancava os cabelos. Investia como cego contra as paredes, e sentava-se um momento para erguer-se de mais furioso ímpeto. Maquinalmente aferrava das pistolas, e sacudia os braços vertiginosos. Abria a carta para relê-la, e estava a ponto de rasgá-la, cuidando que iria tarde, ou não lhe chegaria às mãos. Neste conflito de contrários projectos, entrou Mariana, e muito alucinado devia estar Simão para lhe não ver as lágrimas.
O que tu sofrias, nobre coração de mulher pura! Se o que fazes por esse moço é gratidão ao homem que salvou a vida a teu pai, que rara virtude a tua! Se o amas, se por lhe dar alívio às dores, tu mesma lhe desempeces o caminho por onde te ele há-de fugir para sempre, que nome darei ao teu heroísmo?! Que anjo te fadou o coração para a santidade desse obscuro martírio?!
– Estou pronta – disse Mariana.