Suspendemos aqui o extracto da carta, para não anteciparmos a narrativa de sucessos, que importa, em respeito à arte, atar no fio cortado.
Simão Botelho vira imperturbável chegar o dia do julgamento. Sentou-se no banco dos homicidas sem patrono, nem testemunhas de defesa. Às perguntas respondeu com o ânimo frio daquelas respostas ao interrogatório do juiz. Obrigado a explicar a causa do crime, deu-a com toda a lealdade, sem articular o nome de Teresa Clementina de Albuquerque. Quando o advogado da acusação proferiu aquele nome, Simão Botelho ergueu-se de golpe, e exclamou:
– Que vem aqui fazer o nome de uma senhora a este antro de infâmia e sangue? Que miserável acusador está aí, que não sabe, com a confissão do réu, provar a necessidade do carrasco sem enlamear a reputação duma mulher? A minha acusação está feita: eu a fiz; agora a lei que fale, e cale-se o vilão que não sabe acusar sem infamar.
O juiz impôs-lhe silêncio. Simão sentou-se, murmurando:
– Miseráveis todos!
Ouviu o réu a sentença de morte natural para sempre na forca, arvorada no local do delito. E ao mesmo tempo saíram dentre a multidão uns gritos dilacerantes. Simão voltou a face para as turbas, e disse:
– Ides ter um belo espectáculo, senhores! A forca é a única festa do povo! Levai daí essa pobre mulher que chora: essa é a criatura única para quem o meu suplício não será um passatempo.
Mariana foi transportada em braços à sua casinha, na vizinhança da cadeia. Os robustos braços que a levaram eram os do seu pai.
Simão Botelho, quando, em toda a agilidade e força dos dezoito anos, ia do tribunal ao cárcere, ouviu algumas vozes que se alternavam deste modo:
– Quando vai ele a padecer?
– É bem feito! Vai pagar pelos inocentes que o pai mandou enforcar.
– Queria apanhar a morgada à força de balas!
– Não que estes fidalgos cuidam que não é mais senão matar!…
– Matasse ele um pobre, e tu verias como ele estava em casa!
– Também é verdade!
– E como ele vai de cara no ar!