O Crime do Padre Amaro - Cap. 14: Capítulo 14 Pág. 268 / 478

Todos se voltaram, na surpresa que dava aquela indignação, a olhar o largo volume encadernado que Natário indicava com a ponta do guarda- chuva, como um objeto abominável. D. Maria da Assunção aproximou-se logo de olho reluzente, imaginando que seria alguma dessas novelas, tão famosas, em que se passam coisas imorais. E Amélia chegando-se também, disse, admirada de tal reprovação: .

- Mas é o Panorama... É um volume do Panorama...

- Que é o Panorama vejo eu, disse Natário, com secura. Mas também veio isto. - Abriu o volume na primeira página branca, e leu alto: - "Pertence-me este volume a mim, João Eduardo Barbosa, e serve-me de recreio nos meus ócios". Não compreende, hem? Pois é muito simples... Parece incrível que as senhoras não saibam que esse homem, desde que pôs as mãos num sacerdote, está ipso facto excomungado, e excomunga- dos todos os objetos que lhe pertencem!

Todas as senhoras, instintivamente, afastaram-se do aparador onde jazia aberto o Panorama fatal, arrebanhando-se, num arrepiamento de medo, àquela ideia da Excomunhão que se lhes representava com um desabamento de catástrofes, um aguaceiro de raios despedidos das mãos do Deus Vingador: e ali ficaram mudas, num semicírculo apavorado, em torno de Natário, que, de capotão pelos ombros e braços cruzados, gozava o efeito da sua revelação.

Então a S. Joaneira, no seu assombro, arriscou-se a perguntar:

- O Sr. padre Natário está a falar sério?

Natário indignou-se:

- Se estou a falar sério!? Essa é forte! Pois eu havia de gracejar sobre um caso de excomunhão, minha senhora? Pergunte aí ao senhor cônego se eu estou a gracejar!

Todos os olhos se voltaram para o cônego, essa inesgotável fonte de saber eclesiástico.





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