O Crime do Padre Amaro - Cap. 23: Capítulo 23 Pág. 437 / 478

Ao passar na Ricoça, João Eduardo, como sempre, pôs a passo a égua baia. Mas não viu por trás dos vidros a costumada face pálida sob o lenço escarlate. As portadas da janela estavam meio cerradas; e ao portão, desatrelado com os varões em terra, o cabriolé do doutor Gouveia.

* * *

É que tinha chegado enfim o dial Nessa manhã viera da Ricoça um moço da quinta com um bilhete de Amélia quase ininteligível - Dionísia depressa, a coisa chegou! Trazia ordem também de ir chamar o senhor Gouveia. Amaro foi ele mesmo avisar a Dionísia.

Dias antes, tinha-lhe dito que D. Josefa, a própria D. Josefa, lhe inculcara uma ama - que ele já ajustara, grande mulher, rija como um castanheiro. E agora combinaram rapidamente que nessa noite Amaro se postaria com a ama à portinha do pomar, e Dionísia viria dar-lhe a criança bem atabafada.

- Às nove da noite, Dionísia. E não nos faça esperar! - recomendou-lhe ainda Amaro vendo-a abalar num espalhafato.

Depois voltou a casa e fechou-se no quarto, face a face com aquela dificuldade que ele sentia como uma coisa viva fixá-lo e interrogá-lo: - Que havia de fazer à criança? Tinha ainda tempo de ir aos Poiais ajustar a outra ama, a boa ama que a Dionísia conhecia; ou podia montar a cavalo e ir à Barrosa falar à Carlota... E ali estava, diante daqueles dois caminhos, hesitando numa agonia. Queria serenar, discutir aquele caso como se fosse um ponto de teologia, pesando-lhe os prós e os contras: mas tinha temerariamente diante de si, em lugar de dois argumentos, duas visões: - a criança a crescer e a viver nos Poiais, ou a criança esganada pela Carlota a um canto da estrada da Barrosa... - E, passeando pelo quarto, suava de angústia, quando no patamar a voz inesperada do Libaninho gritou:

- Abre; parocozinho, que sei que estás em casa!





Os capítulos deste livro