O Primo Basílio - Cap. 6: CAPÍTULO VI Pág. 179 / 414

Mas Julião desprezou a injúria, e continuou, exaltado nas suas idéias:

- Que nos importa a nós o princípio da vida? Importa-me tanto como a primeira camisa que vesti! O principio da vida é como outro qualquer princípio:

um segredo! Havemos de ignorá-lo eternamente! Não podemos saber nenhum principio. A vida, a morte, as origens, os fins, mistérios! São causas primárias com que não temos nada a fazer, nada! Podemos batalhar séculos, que não avançamos uma polegada. O físiologista, o químico, não têm nada com os princípios das coisas; o que lhes importa são os fenômenos! Ora, os fenômenos e as suas causas imediatas, meu caro amigo, podem ser determinadas com tanto rigor nos corpos brutos, como nos corpos vivos - numa pedra, como num desembargador! E a Fisiologia e a Medicina são ciências tão exatas como a Química! Isto já vem de Descartes!

Travaram então um berreiro sobre Descartes. E imediatamente, sem que Sebastião atônito tivesse descoberto a transição, encarniçaram-se sobre a idéia de Deus.

O estudante parecia necessitar Deus para explicar o Universo. Mas Julião atacava Deus com cólera: chamava-lhe uma hipótese safada", "uma velha caturrice do partido miguelista"! E começaram a assaltar-se sobre a questão social, como dois galos inimigos.

O estudante, com os olhos esgazeados, sustentava, dando punhadas sobre a mesa, o princípio da autoridade! Julião berrava pela "anarquia individual!" E depois de citarem com fúria Proudhon, Bastiat, Jouffroy romperam em personalidades. Julião, que dominava pela estridência da voz, censurou violentamente ao estudante - as suas inscrições a seis por cento, o ridículo de ser filho de um corretor de fundos, e o bife de proprietário que vinha de comer na Áurea!

Olharam-se, então, com rancor.





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