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Capítulo 6: CAPÍTULO VI

Página 188

Era uma velha que fora inculcadeira. Ainda tinha mesmo na cancela, numa placa de metal, com letras negras: "VITÓRIA SOARES, INCULCADEIRA". Mas nos últimos anos a sua indústria tornou-se mais complicada, muito tortuosa.

Exercia-a numa saleta esteirada, com mosquiteiros de papel pendentes do teto encardido, alumiada por duas tristes janelas de peito. Um vasto sofá ocupava quase a parede do fundo; fora decerto de repes verde, mas o estofo coçado, comido, remendado, tinha agora, sob largas nódoas, uma vaga cor parda; as molas partidas, rangiam com estalidos melancólicos; a um dos cantos, numa cova que o uso cavara, dormia todo o dia um gato; e um dos lados da madeira queimada revelava que fora salvo de um incêndio. Sobre o sofá pendia a litografia do senhor D. Pedro IV. Entre as duas janelas havia uma cómoda alta; e em cima, entre um Santo Antônio e um cofre feito de búzios, um macaquinho empalhado, com olhos de vidro, equilibrava-se sobre um galho de árvore. Ao entrar via-se logo, junto da janela fronteira à porta, a uma mesa coberta de oleado, um dorso magro e curvado, e um barretinho de seda com uma borla arrebitada. Era do Sr. Gouveia, o escriturário!

O ar abafado tinha um cheiro complexo, indefinido - em que se sentia a cavalariça, a graxa e o refogado. Havia sempre gente: grossas matronas de capote e lenço, face gordalhufa e buço; cocheiros com o cabelo acamado, muito lustroso de óleo, e blusa de riscadinho; pesados galegos cor de greda, de passadas retumbantes e formas lorpas; criadinhas de dentro, amareladas, de olheiras, sombrinha de cabo de osso, e as luvas de pelica com passagens nas pontas dos dedos.

Defronte da sala abria-se um quarto que deitava para o saguão, por cuja portinha verde se viam às vezes desaparecer dorsos respeitáveis de proprietários, ou caudas espalhafatosas de vestidos suspeitos.

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pág. 188 (Capítulo 6)

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Capa do livro O Primo Basílio
Páginas: 414
Página atual: 188

 
   
 
   
Os capítulos deste livro:
CAPÍTULO I 1
CAPÍTULO II 24
CAPÍTULO III 45
CAPÍTULO IV 70
CAPÍTULO V 121
CAPÍTULO VI 154
CAPÍTULO VII 191
CAPÍTULO VIII 213
CAPÍTULO IX 251
CAPÍTULO X 273
CAPÍTULO XI 293
CAPÍTULO XII 327
CAPÍTULO XIII 346
CAPÍTULO XIV 366
CAPÍTULO XV 387
CAPÍTULO XVI 400
"O PRIMO BASÍLIO" (CARTA A TEÓFILO BRAGA) 411