Ao sair examinou, admirado, o quarto:
- Estava mais bem alojada que eu, o estafermo!
Fechou a porta, deu a volta à chave:
- Requiescat in pace - disse.
E desceram, calados.
Ao entrar na sala, Sebastião, muito pálido, pôs a mão no ombro de Julião:
- Então achas que foi o aneurisma?
- Foi. Enfureceu-se, estourou. É dos livros...
- Se não se tivesse zangado hoje...
- Estourava amanhã. Estava nas últimas... Deixa em paz a criatura. Está começando a esta hora a apodrecer, não a perturbemos.
Declarou então, esfregando as mãos com frio, que comia alguma coisa. Achou no armário um pedaço de vitela fria, uma garrafa meia de Colares. Instalou-se e, com a boca cheia, deitando o vinho do alto:
- Então sabes a novidade, Sebastião?
- Não.
- O meu concorrente foi despachado!
Sebastião murmurou:
- Que ferro!
- Era previsto - disse Julião com um grande gesto. - Eu ia fazer um escândalo, mas... - e teve um risinho - amansaram-me! Estou num posto médico, deram-me um posto médico! Atiraram-me um osso!
- Sim? - fez Sebastião. - Homem, ainda bem, parabéns. E agora?
- Agora, roê-lo.
De resto, tinham-lhe prometido a primeira vagatura. O posto médico não mau... Em definitivo, a situação melhorara...
- Mas mesquinha, mesquinha! Não saio do atoleiro...
Estava farto de Medicina, disse depois de um silêncio. Era um beco sem saída. Devia-se ter feito advogado, político, intrigante. Tinha nascido para isso!
Ergueu-se, e com grandes passadas pela sala, o cigarro na mão, a voz cortante, expôs um plano de ambição: - O país está a preceito para um intrigante com vontade! Esta gente toda está velha, cheia de doenças, de catarros de bexiga, de antigas sífilis! Tudo isto está podre por dentro e por fora! O velho mundo constitucional vai a cair aos pedaços.