A propósito, algum dos senhores tem visto o Ega estes últimos dias?
Ninguém respondeu, no interesse súbito que causava a cartada. A longa mão de D. Diogo recolhia devagar a vasa – e languidamente, no mesmo silêncio, soltou uma carta de paus.
- Ó Diogo! ó Diogo! gritou Afonso, estorcendo-se, como se o trespassasse um ferro.
Mas conteve-se. O general, cujos olhos despediam faíscas, colocou o seu valete; Afonso, profundamente infeliz, separou-se do rei de paus; Vilaça bateu de estalo com o az. E imediatamente foi em redor uma discussão tremenda sobre a puxada de D. Diogo – em quanto Carlos, a quem as cartas sempre enfastiavam, se debruçava a coçar o ventre fofo do venerável Reverendo.
- Que perguntavas tu, filho? disse enfim Afonso erguendo-se, ainda irritado, a buscar tabaco para o cachimbo, sua consolação nas derrotas. O Ega? Não, ninguém o viu, não tornou a aparecer! Está também um bom ingrato, esse John...
Ao nome do Ega, Vilaça, parando de baralhar as cartas, erguera a face curiosa:
- Então sempre é certo que ele vai montar casa?
Foi Afonso que respondeu, sorrindo e acendendo o cachimbo:
- Montar casa, comprar coupé, deitar libré, dar soirées literárias, publicar um poema, o diabo!
- Ele esteve lá no escritório, dizia Vilaça recomeçando a baralhar. Esteve lá a indagar o que tinha custado o consultório, a mobília de veludo, etc. O veludo verde deu-lhe no goto... Eu, como é um amigo da casa, lá lhe prestei informações, até lhe mostrei as contas. - E respondendo a uma pergunta do Sequeira: - Sim, a mãe tem dinheiro, e creio que lhe dá o bastante. Que em quanto a mim, ele vem-se meter na política. Tem talento, fala bem, o pai já era muito regenerador... Ali há ambição.
- Ali há mulher, disse D. Diogo, colocando com peso esta decisão e acentuando-a com uma caricia lânguida à ponta frisada dos bigodes brancos. Lê-se-lhe na cara, basta ver-lhe a cara... Ali há mulher.
Carlos sorria, gabando a penetração de D. Diogo, o seu fino olho à Balzac; e Sequeira, logo, franco como velho soldado, quis saber quem era a Dulcineia.