E quando ouviu que eram precisos tantos agasalhos, que teria de estar ali no quarto ainda quinze dias, perturbou-se mais, duas lagrimazinhas tímidas quase lhe fugiram das pestanas. Carlos terminou por lhe afagar paternalmente a mão.
- Oh! Thank you sir! murmurou ela, comovida de todo.
Na sala, Carlos veio encontrar Maria Eduarda sentada junto da mesa, arranjando ramos, com uma grande cesta de flores pousada ao lado numa cadeira, e o regaço cheio de cravos. Uma bela réstia de sol, estendida na esteira, vinha morrer-lhe aos pés; e Niniche, deitada ali, reluzia como se fosse feita de fios de prata. Na rua, sob as janelas, um realejo ia tocando, na alegria da linda manhã de sol, a valsa da Madame Angot. Pelo andar de cima tinham recomeçado as correrias de crianças brincando.
- Então? exclamou ela, voltando-se logo, com um molho de cravos na mão.
Carlos tranquilizou-a. A pobre miss Sarah tinha uma bronquite ligeira, com pouca febre. Em todo o caso necessitava resguardo, toda a cautela...
- Certamente! E há de tomar algum remédio, não é verdade?
Atirou logo o resto dos cravos do regaço para o cesto, foi abrir uma secretariazinha de pau-preto colocada entre as janelas. Ela mesmo arranjou o papel para ele receitar, meteu um bico novo na pena. E estes cuidados perturbavam Carlos como caricias.
- Oh minha senhora!... murmurava ele, um lápis basta...
Quando se sentou, os seus olhos demoraram-se com uma curiosidade enternecida nesses objectos familiares onde pousava a doçura das mãos dela - um sinete d'ágata sobre um velho livro de contas, uma faca de marfim com monograma de prata ao lado de uma taça de Saxe cheia destaropilhas; e em tudo havia a ordem clara que tão bem condizia com o seu puro perfil. Na rua o realejo calara-se, por cima do tecto já não cavalavam as crianças. E, em quanto escrevia devagar, Carlos sentia-a abafar sobre a esteira o som dos seus passos, mover os seus vasos mais de leve.