Os Maias - Cap. 2: Capítulo 2 Pág. 33 / 630

Prometera-lhe que daí a duas semanas podia caçar outra vez na Tojeira; e o príncipe estava já fumando o seu charuto.

Belo rapaz! Parecia simpatizar com o papá Monforte...

Toda essa noite Maria dormiu mal, na excitação vaga que lhe dava aquela ideia de um príncipe entusiasta, conspirador, condenado à morte, ferido agora por cima do seu quarto.

Logo de manhã cedo - apenas Pedro saíra a fazer transportar, ele mesmo, do hotel, as bagagens do napolitano - Maria mandou a sua criada francesa de quarto, uma bela moça de Arles, acima, saber da parte dela como S. Alteza passara, e «ver que figura tinha». A arlesiana apareceu, com os olhos brilhantes, a dizer à senhora, nos seus grandes gestos de Provençal, que nunca vira um homem tão formoso! Era uma pintura de Nosso Senhor Jesus Cristo! Que pescoço, que brancura de mármore! Estava muito pálido ainda; agradecia enternecido os cuidados de Madame Maia; e ficara a ler o jornal encostado aos travesseiros...

Maria, desde então, não pareceu interessar-se mais pelo ferido. Era Pedro que vinha, a cada instante, falar-lhe dele, entusiasmado por aquela existência patética de príncipe conspirador, partilhando já o seu ódio aos Bourbons, encantado com a similitude de gostos que encontrava nele, o mesmo amor da caça, dos cavalos, das armas. Agora logo de manhã, subia para o quarto do Príncipe, de robe-de-chambre e cachimbo na boca, e passava lá horas numa camaradagem, fazendo grogs quentes – permitidos pelo Dr. Guedes. Levava mesmo para lá os seus amigos, o Alencar, o D. João da Cunha. Maria sentia-lhes por cima as risadas. às vezes tocava-se viola. E o velho Monforte, pasmado para o herói, não cessava de lhe rondar o leito.

A Arlesiana, essa, também a cada momento aparecia lá a levar toalhas de rendas, um açucareiro que ninguém reclamara, ou algum vaso com flores para alegrar a alcova... Maria, por fim, perguntou a Pedro, muito seria, se além de todos os amigos da casa, duas enfermeiras, dois escudeiros, o papá e ele Pedro - era necessária também constantemente a sua própria criada no quarto de Sua Alteza!





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