E o Gouvarinho, como compete ao individuo daquela espécie, acrescentou logo que havíamos de ter também «o nosso Maia». O Maia dele, e o Maia dela... Santo acordo! Suavíssimo arranjo!
Carlos olhou-o com severidade.
- Tu vens obsceno de Celorico, Ega.
- É o fluo se aprende no seio da Santa Madre Igreja.
Mas também Carlos tinha uma novidade que o devia fazer estremecer. O Ega porém já sabia. A chegada dos Cohens, não é verdade? Lera-o logo nessa manhã, na Gazeta Ilustrada no high-life. Lá se dizia respeitosamente que s. Ex.ªs tinham regressado do seu passeio pelo estrangeiro.
- E que impressão te fez? perguntou Carlos rindo.
O outro encolheu brutalmente os ombros:
- Fez-me o efeito de haver um cabrão mais na cidade.
E, como Carlos o acusava outra vez de trazer de Celorico uma língua imunda, o Ega, um pouco corado, arrependido talvez, lançou-se em considerações críticas, clamando pela necessidade social de dar às coisas o nome exacto. Para que servia então o grande movimento naturalista do século? Se o vício se perpetuava, é porque a sociedade, indulgente e romanesca, lhe dava nomes que o embelezavam, que o idealizavam... Que escrúpulo pode ter uma mulher em beijocar um terceiro entre os lençóis conjugais, se o mundo chama a isso sentimentalmente um romance, e os poetas o cantam em estrofes de ouro?
- E a propósito, a tua comédia, o Lodaçal? perguntou Carlos, que entrara um instante para a alcova de banho.
- Abandonei-a, disse o Ega. Era feroz de mais... E além disso fazia-me remexer na podridão lisboeta, mergulhar outra vez na sarjeta humana... Afligia-me...
Parou diante do grande espelho, deu um olhar descontente ao seu jaquetão claro e às botas com mau verniz.
- Preciso enfardelar-me de novo, Carlinhos... O Poole naturalmente mandou-te fato de verão, hei de querer examinar esses cortes da alta civilização... Não há como negá-lo, diabo, esta minha linha está chinfrim!