Os Maias - Cap. 14: Capítulo 14 Pág. 434 / 630

A culpa não fora dela! não fora dela! Ele devia ter perguntado àquele homem que sabia toda a sua vida... fora sua mãe... Era horroroso dizê-lo, mas fora por causa dela que conhecera e que fugira com o primeiro homem, o outro, um irlandês... E tinha vivido com ele quatro anos, como sua esposa, tão fiel, tão retirada de tudo e só ocupada da sua casa, que ele ia casar com ela! Mas morrera na guerra com os alemães, na batalha de Saint-Privat. E ela ficara com Rosa, com a mãe já doente, sem recursos, depois de vender tudo... Ao princípio trabalhara... Em Londres tinha procurado dar lições de piano... Tudo falhara, dois dias vivera sem lume, de peixe salgado, vendo Rosa com fome! com fome! Ah, ele não podia perceber o que isto era!... Quase fora por caridade que as tinha repatriado para Paris... E aí conhecera Castro Gomes. Era horrível, mas que havia dela fazer! Estava perdida...

Lentamente escorregara do sofá, caíra aos pés de Carlos. E ele permanecia móvel, mudo, com o coração rasgado por angústias diferentes: era uma compaixão tremula por todas aquelas misérias sofridas, dor de mãe, trabalho procurado, fome, que lha tornavam confusamente mais querida; e era o horror desse outro homem, o irlandês, que surgia agora, e que lha tornava de repente mais maculada...

Ela continuava falando de Castro Gomes. Vivera três anos com ele, honestamente, sem um desvio, sem um pensamento mau. O seu desejo era estar quieta em casa. Ele é que a forçava a andar em ceias, em noitadas...

E Carlos não podia ouvir mais, torturado. Repeliu-lhe as mãos, que procuravam as suas. Queria fugir, queria findar!...

- Oh não, não me mandes embora! gritou ela prendendo-se a ele ansiosamente. Eu sei que não mereço nada! Sou uma desgraçada... Mas não tive coragem, meu amor! Tu és homem, não compreendes estas coisas... Olha para mim! porque não olhas para mim? Um instante só, não voltes o rosto, tem pena de mim...





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