Carlos pulava nos joelhos do avô, muito divertido com aqueles longos abraços que juntavam as duas cabeças dos velhos – uma com as repas achatadas sobre a calva, outra com uma grande coroa aberta numa mata de cabelo branco. E como eles, de mãos dadas, continuavam a admirar-se, a estudarem um no outro as rugas dos anos, Afonso disse:
- Vilaça! a Sr.ª viscondessa...
O administrador porém procurou-a debalde, com os olhos abertos pela sala. Carlos ria, batendo as mãos: - e Vilaça descobriu-a enfim a um canto, entre o aparador e a janela, sentada numa cadeirinha baixa, vestida de preto, tímida e queda, com os braços rechonchudos pousados sobre a obesidade da cinta. O rosto anafado e mole, branco como papel, as roscas do pescoço, cobriram-se-lhe subitamente de rubor; não achou uma palavra para dizer ao Vilaça, e estendeu-lhe a mão papuda e pálida, com um dedo embrulhado num pedaço de seda negra. Depois ficou a abanar-se com um grande leque de lentejoulas, o seio a arfar, os olhos no regaço, como exausta daquele esforço.
Dois escudeiros tinham começado a servir a sopa, o Teixeira esperava, perfilado por traz do alto espaldar da cadeira de Afonso.
Mas Carlos cavalgava ainda o avô, querendo acabar outra história. Era o Manuel, trazia uma pedra na mão... Ele primeiro pensara ir às boas; mas os dois rapazes começaram a rir... De maneira que os correu a todos...
- E maiores que tu?
- três rapagões, vovô, pode perguntar à tia Pedra... Ela viu, que estava na eira. Um deles trazia uma foice...
- Está bom, senhor, está bom, ficamos inteirados... Vá, desmonte, que está a sopa a esfriar. Upa! upa!
E o velho, com o seu aspecto resplandecente de patriarca feliz, veio sentar-se ao alto da mesa, sorrindo e dizendo:
- Já se vai fazendo pesado, já não está para colo...
Mas reparou então no Brown, e tornando a erguer-se fez a apresentação do procurador.
- O Sr. Brown, o amigo Vilaça... Peço perdão, descuidei-me, foi culpa daquele cavalheiro lá ao fundo da mesa, o Sr. D. Carlos de mata-sete!