E quando ela fugiu com o irlandês, o MacGren, foi comigo que a mãe veio ter, furiosa, a querer que eu chamasse o comissário de polícia para se prender o irlandês. Por fim meteu-se num fiacre, foi para Fontainebleau, lá fez as pazes, viviam até juntos... Enfim uma série de trapalhadas.
Um suspiro cansado escapou-se do peito do Ega, que arrastava os passos, sucumbido:
- E esta senhora, está claro, não sabia então de quem era filha...
O Sr. Guimarães encolheu os ombros:
- Nem suspeitava que existissem Maias sobre a face da terra! A Monforte dissera-lhe sempre que o pai era um fidalgo austríaco com quem ela casara na Madeira... Uma mixórdia, meu caro senhor, uma mixórdia!
- É horrível! murmurou Ega.
Mas, dizia o Sr. Guimarães, que podia também fazer a Monforte? Que diabo, era duro confessar à filha: «Olha que eu fugi a teu pai, e ele por causa disso matou-se!» Não tanto pela questão de pudor; a rapariga devia perceber que a mãe tinha amantes, ela mesma aos dezoito anos, coitadinha, já tinha um; mas por causa do tiro, do cadáver, do sangue...
-A mim mesmo! exclamou o Sr. Guimarães, parando, alargando os braços na rua deserta. A mim mesmo nunca ela falou do marido, nem de Lisboa, nem de Portugal. Lembra-me até uma ocasião em casa da Clemence, que eu aludi a um cavalo lazão, um cavalo de Pedro da Maia, em que ela costumava montar. Animal soberbo! Mas nem mencionei o marido, falei só do cavalo. Pois senhores, bate com o leque em cima da mesa, grita como uma bicha: - Dites donc, mon cher, vous m'embêtez avec ces histoires de l'autre monde!... Com efeito, bem o podia dizer, eram histórias do outro mundo! Para encurtar: estou convencido que nos últimos tempos ela mesmo julgava que Pedro da Maia nunca existira. Uma insensata! Por fim até bebia... Mas acabou-se! Tinha grande coração, e portou-se muito bem com a Clemence. Parce sepultis!
- É horrível! murmurou outra vez o Ega, tirando o chapéu correndo a mão tremula pela testa.
E agora o seu único desejo era a acumulação incessante de provas, de detalhes.