Todos gostaram muito dela, Afonso da Maia tinha grande ternura pela pequena...
E de repente indignou-se com estas invenções por onde arrastava já o nome do nobre velho, exclamou como se abafasse:
- Enfim, nem eu sei, um horror!
- Um drama! resumiu gravemente o Sr. Guimarães.
E como estavam no Pelourinho rogou ao Ega que esperasse um momento enquanto ele corria acima buscar os papeis da Monforte.
Só, no largo, Ega ergueu as mãos ao céu num desabafo mudo daquela angústia em que caminhava, como um sonâmbulo, desde o Loreto. E a sua única sensação, bem clara - era a indestrutível certeza da história do Guimarães, tão compacta, sem uma lacuna, sem uma falha por onde rachasse e se fizesse cair aos pedaços. O homem conhecera Maria Monforte em Lisboa, ainda mulher de Pedro da Maia, brilhando no seu cavalo lazão; encontrara-a em Paris já fugida, depois da morte do primeiro amante, vivendo com outros; andara então ao colo com Maria Eduarda a quem se davam bonecas... E desde então não deixara mais de ver Maria Eduarda, de a seguir: em Paris; no convento de Tours; em Fontainebleau com o irlandês; nos braços de Castro Gomes; numa tipoia de praça enfim com ele e com Carlos da Maia, havia dias, no cais do Sodré! Tudo isto se encadeava, concordando com a história contada por Maria Eduarda. E de tudo ressaltava esta certeza monstruosa: - Carlos amante da irmã!
Guimarães não descia. No segundo andar surgira uma luz viva, numa janela aberta. Ega recomeçou a passear lentamente pelo meio do largo. E agora, pouco a pouco, subiu nele uma incredulidade contra esta catástrofe de dramalhão. Era acaso verosímil que tal se passasse, com um amigo seu, numa rua de Lisboa, numa casa alugada à mãe Cruges?... Não podia ser! Esses horrores só se produziam na confusão social, no tumulto da Meia-Idade! Mas numa sociedade burguesa, bem policiada, bem escriturada, garantida por tantas leis, documentada por tantos papeis, com tanto registro de baptismo, com tanta certidão de casamento, não podia ser! Não!