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Capítulo 17: Capítulo 17

Página 586
Os seus movimentos na cama, ainda nessa noite, o tinham assustado como se fossem os de uma fera, lenta e ciosa, que se estirava para o devorar... Quando os seus braços o enlaçavam, o esmagavam contra os seus rijos peitos húmidos de seiva, ainda decerto lhe punham nas veias uma chama que era toda bestial. Mas, apenas o último suspiro lhe morria nos lábios, aí começava insensivelmente a recuar para a borda do colchão, com um susto estranho: e imóvel, encolhido na roupa, perdido no fundo de uma infinita tristeza, esquecia-se pensando numa outra vida que podia ter, longe dali, numa casa simples, toda aberta ao sol, com sua mulher, legitimamente sua, flor de graça domestica, pequenina, tímida, pudica, que não soltasse aqueles gritos lascivos, e não usasse esse aroma tão quente! E desgraçadamente agora já não duvidava... Se partisse com ela, seria para bem cedo se debater no indizível horror de um nojo físico. E que lhe restaria então, morta a paixão que fora a desculpa do crime, ligado para sempre a uma mulher que o enojava - e que era... Só lhe restava matar-se!

Mas, tendo por um só dia dormido com ela, na plena consciência da consanguinidade que os separava, poderia recomeçar a vida tranquilamente? Ainda que possuísse frieza e força para apagar dentro em si essa memória - ela não morreria no coração do avô, e do seu amigo. Aquele ascoroso segredo ficaria entre eles, estragando, maculando tudo. A existência d'ora avante só lhe oferecia intolerável amargor... Que fazer, santo Deus, que fazer! Ah, se alguém o pudesse aconselhar, o pudesse consolar! Quando chegou à porta de casa o seu desejo único era atirar-se aos pés de um padre, aos pés de um santo, abrir-lhe as misérias do seu coração, implorar-lhe a doçura da sua misericórdia! Mas ali onde havia um santo?

Defronte do Ramalhete os candeeiros ainda ardiam. Abriu de leve a porta. Pé ante pé, subiu as escadas ensurdecidas pelo veludo cor de cereja. No patamar tacteava, procurava a vela - quando, através do reposteiro entreaberto, avistou uma claridade que se movia no fundo do quarto. Nervoso, recuou, parou no recanto.

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Capa do livro Os Maias
Páginas: 630
Página atual: 586

 
   
 
   
Os capítulos deste livro:
Capítulo 1 1
Capítulo 2 26
Capítulo 3 45
Capítulo 4 75
Capítulo 5 98
Capítulo 6 126
Capítulo 7 162
Capítulo 8 189
Capítulo 9 218
Capítulo 10 260
Capítulo 11 301
Capítulo 12 332
Capítulo 13 365
Capítulo 14 389
Capítulo 15 439
Capítulo 16 511
Capítulo 17 550
Capítulo 18 605