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Capítulo 18: Capítulo 18

Página 618
Que faziam ,ali, às horas de trabalho, aqueles moços tristes, de calça esguia? Não havia mulheres. Apenas num banco adiante uma criatura adoentada, de lenço e chale, tomava o sol; e duas matronas, com vidrilhos no mantelete, donas de casa de hóspedes, arejavam um cãozinho felpudo. O que atraía pois ali aquela mocidade pálida? E o que sobretudo o espantava eram as botas desses cavalheiros, botas despropositadamente compridas, rompendo para fora da calça colante com pontas aguçadas e reviradas como proas de barcos varinos...

- Isto é fantástico, Ega!

Ega esfregava as mãos. Sim, mas precioso! Porque essa simples forma de botas explicava todo o Portugal contemporâneo. Via-se por ali como a coisa era. Tendo abandonado o seu feitio antigo, à D. João VI, que tão bem lhe ficava, este desgraçado Portugal decidira arranjar-se à moderna: mas sem originalidade, sem força, sem carácter para criar um feitio seu, um feitio próprio, manda vir modelos do estrangeiro - modelos de ideias, de calças, de costumes, de leis, de arte, de cozinha... Somente, como lhe falta o sentimento da proporção, e ao mesmo tempo o domina a impaciência de parecer muito moderno e muito civilizado - exagera o modelo, deforma-o, estraga-o até à caricatura. O figurino da bota que veio de fora era levemente estreito na ponta; - imediatamente o janota estica-o e aguça-o até ao bico de alfinete. Por seu lado o escritor lê uma página de Goncourt ou de Verlaine em estilo precioso e cinzelado; - imediatamente retorce, emaranha, desengonça a sua pobre frase até descambar no delirante e no burlesco. Por sua vez o legislador ouve dizer que lá fora se levanta o nível da instrução; - imediatamente põe no programa dos exames de primeiras letras a metafísica, a astronomia, a filologia, a egiptologia, a carismática, a critica das religiões comparadas, e outros infinitos terrores. E tudo por aí adiante assim, em todas as classes e profissões, desde o orador até ao fotografo, desde o jurisconsulto até ao sportman... é o que sucede com os pretos já corrompidos de S. Tomé, que vêem os europeus de lunetas - e imaginam que nisso consiste ser civilizado e ser branco.

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Capa do livro Os Maias
Páginas: 630
Página atual: 618

 
   
 
   
Os capítulos deste livro:
Capítulo 1 1
Capítulo 2 26
Capítulo 3 45
Capítulo 4 75
Capítulo 5 98
Capítulo 6 126
Capítulo 7 162
Capítulo 8 189
Capítulo 9 218
Capítulo 10 260
Capítulo 11 301
Capítulo 12 332
Capítulo 13 365
Capítulo 14 389
Capítulo 15 439
Capítulo 16 511
Capítulo 17 550
Capítulo 18 605