Os Maias - Cap. 3: Capítulo 3 Pág. 67 / 630

E assim lhe estavam arranjando uma almazinha de bacharel...

Vilaça teve outra risadinha silenciosa. Depois, como subitamente decidido, ergueu-se, fez estalar os dedos, disse estas palavras:

- V. Ex.ª sabe que apareceu a Monforte?

Afonso, sem mover a cabeça, reclinado para as costas da poltrona, perguntou tranquilamente, envolvido no fumo do cachimbo:

- Em Lisboa?

- Não senhor, em Paris. Viu-a lá o Alencar, esse rapaz que escreve, e que era muito de Arroios... Esteve até em casa dela.

E ficaram calados. Havia anos que entre eles se não pronunciara o nome de Maria Monforte. Ao princípio, quando se retirara para Santa Olávia, a preocupação ardente de Afonso da Maia fora tirar-lhe a filha que ela levara. Mas a esse tempo ninguém sabia onde Maria se refugiara com o seu príncipe: nem pela influência das legações, nem pagando regiamente a polícia secreta de Paris, de Londres, de Madrid, se pode descobrir a «toca da fera» como dizia então o Vilaça. Ambos decerto tinham mudado de nome; e, dadas essas naturezas boémias, quem sabe se não errariam agora pela América, pela Índia, em regiões mais exóticas? Depois, pouco a pouco, Afonso da Maia descorçoado com aqueles esforços vãos, todo ocupado do neto que crescia belo e forte ao seu lado, no enternecimento continuo que ele lhe dava foi esquecendo a Monforte e a sua outra neta, tão distante, tão vaga, a quem ignorava as feições, de quem mal sabia o nome. E agora de repente a Monforte aparecia outra vez em Paris! e o seu pobre Pedro estava morto! E aquela criança que dormia ao fundo do corredor nunca vira sua mãe...

Erguera-se, passeava na livraria, pesado e lento, com a cabeça baixa. Junto à mesa, ao pé do candeeiro, o Vilaça ia percorrendo um a um os papéis da sua carteira.

- E está em Paris com o italiano? perguntou Afonso do fundo sombrio do aposento.

O Vilaça ergueu a cabeça de sobre a carteira, e disse:

- Não senhor, está com quem lhe paga.





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