O Processo - Cap. 7: Capítulo 7 Pág. 103 / 183

Erguendo lentamente os olhos até onde lhe era possível, tentou ver o que se estava a passar, em seguida agarrou à toa num dos papéis de cima da secretária, colocou-o na palma da mão aberta e, à medida que ia levantando a mão, ia-se também erguendo da cadeira até chegar ao nível dos outros dois. Fê-lo sem um fim definido, mas actuava apenas com a sensação de que era assim que devia proceder quando tivesse acabado a grande tarefa de redigir o requerimento que o devia libertar completamente. O subgerente, que prestava a maior atenção à conversa, mal olhou para o papel, sem mesmo ter interesse em ver o que ele continha—tudo o que parecesse importante para o gerente não era importante para ele —, tirou-o das mãos de K. e disse: «Obrigado, já conheço o assunto», e, calmamente, voltou a colocá-lo sobre a mesa. K. lançou-lhe um olhar severo, que o subgerente não notou, ou, se o notou, apenas lhe serviu de gozo; riu-se alto por várias vezes, desconcertou visivelmente o industrial com uma rápida réplica, para no momento seguinte se contradizer, e, finalmente, convidou o industrial a ir até ao seu gabinete, onde juntos podiam finalizar a transacção. «É uma proposta com muito interesse», afirmou ele ao industrial. «Concordo plenamente consigo. E o Sr. Gerente», mesmo ao dizer isto dirigia-se apenas ao industrial, «tenho a certeza de que se sentirá aliviado por lhe tirar este peso de cima dos ombros. Este negócio requer concentração e ele parece estar hoje sobrecarregado; além disso, há horas que tem ali pessoas à sua espera na antessala.» K. ainda tinha o autodomínio suficiente para se desviar do subgerente e dirigir um sorriso amável, mas um tanto determinado, apenas ao industrial; em vez de o fazer, absteve-se desta atitude e, apoiando as mãos na secretária e inclinando-se levemente para a frente, como um funcionaria atencioso, ficou a reflectir enquanto os dois homens, ainda a conversar, reuniam os papéis e se afastavam para o gabinete do subgerente. Mesmo à porta, o industrial voltou-se para dizer que ainda não se despedia porque, evidentemente, voltaria para lhe dar conhecimento do resultado da entrevista; além disso, havia um outro assunto de menor importância sobre o qual gostaria de lhe falar.

K. ficou finalmente só. Não tinha o mínimo interesse em receber mais ninguém e teve a vaga sensação do prazer que era para ele as pessoas que lá fora esperavam pensarem que estava ainda ocupado com o industrial, de tal modo que ninguém, nem mesmo o continuo, pudesse perturbá-lo.





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