O Processo - Cap. 7: Capítulo 7 Pág. 104 / 183

Andou até à janela, empoleirou-se no peitoril, agarrando-se ao fecho com uma das mãos, e olhou para o largo em baixo. A neve caia ainda e o céu continuava nublado.

Esteve assim sentado durante muito tempo, sem efectivamente saber o que o perturbava, voltando de vez em quando a cabeça, com um olhar assustado, para a porta que dava para a antessala, onde lhe parecia ter ouvido um ruído. No entanto, como ninguém entrou, recompôs-se, dirigiu-se ao lavatório, lavou a cara com água fria e voltou para a janela com as ideias mais claras. A decisão de tomar a defesa nas suas próprias mãos parecia-lhe agora cada vez mais síria do que primeiramente imaginara. Enquanto o advogado era o responsável pelo processo, este não o preocupou, encarou-o até com um certo desprendimento e manteve-se afastado dele, podendo acompanhar o seu andamento sempre que quisesse, mas também deixar de o fazer quando lhe apetecesse. Por outro lado, se tivesse de conduzir a sua própria defesa, interferiria no poder decisório do tribunal, pelo menos até ver, uma medida que lhe traria eventualmente a sua absoluta e definitiva absolvição, mas que, entretanto, o envolveria, pelo menos provisoriamente, em muito maiores perigos do que anteriormente. Se alguma vez tivesse duvidado disso, o seu estado de espírito de hoje aquando do encontro com o subgerente e o industrial, teria sido suficientemente convincente. Que entorpecimento se tinha apoderado dele só porque se tinha decidido a conduzir a sua própria defesa! E em que se transformaria ele mais tarde? Que maus dias o esperavam ainda? Encontraria ele alguma vez o caminho certo no meio de tantas dificuldades? O apresentar uma defesa completa e eficaz — não uma defesa qualquer, pois seria uma perda de tempo — não traria como consequência o ter ele de se afastar de qualquer outra actividade? Poderia continuar a executá-la? E como poderia, de dentro do seu gabinete no Banco, conduzir o seu próprio processo? Não era o facto de ter de redigir a contestação, problema que resolveria pedindo uma licença de poucas semanas, se bem que ausentar-se precisamente nesta altura equivalesse a correr um grande risco; todavia, tratava-se de um processo completo, cuja duração não era possível prever. Que obstáculo havia de surgir de repente na carreira de K.!





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