O Processo - Cap. 1: Capítulo 1 Pág. 11 / 183

Mas até era possível que o Inspector não tivesse ouvido, pois tinha colocado a mão aberta firmemente de encontro à mesa, parecendo muito ocupado a comparar o tamanho dos seus dedos. Os dois guardas tinham-se sentado numa arca coberta com um pano bordado, esfregando os joelhos. Os três jovens olhavam à volta sem finalidade, com as mãos nas ancas. Tudo parecia tão silencioso como um escritório vazio. «Venham, meus senhores», gritou K. Era como se nesse momento se tivesse tornado responsável por todos eles. «Pelo vosso aspecto, o meu caso parece estar arrumado. Na minha opinião, a medida mais acertada seria não nos incomodarmos mais com a justiça ou com a injustiça do vosso procedimento e arrumarmos o assunto amigavelmente com um aperto de mãos. Se os senhores forem da mesma opinião, então, por que não?» E caminhou em direcção à mesa do inspector, estendendo a mão. O Inspector levantou os olhos, mordeu os lábios e olhou para a mão de K. estendida na sua direcção; K. ainda acreditou que ele ia aceitar a oh erra. Contudo, em vez disso, levantou-se, agarrou num chapéu duro, redondo, que estava sobre a cama de Frãulein Búrstner, e, com ambas as mãos, colocou-o cuidadosamente na cabeça, como se o estivesse a experimentar pela primeira vez. «Como tudo lhe parece tão simples!», disse ele a K. quando acabou. «O senhor acha então que devemos resolver o assunto amigavelmente? Não, não, isso rea mente não é possível. Não quero com isto dizer que o senhor perca as esperanças. Que ramo teria para o fazer? O senhor está apenas sob prisão, nada mais. Foi-me pedido que o informasse disto. Assim o fiz e observei também as suas reacções. Chega por hoje e agora queremos dizer-lhe adeus, embora temporariamente. O senhor vai até ao Banco, não é verdade?» «Ao Banco?», perguntou K. «Pensei que estava preso.» K. fez a pergunta com uma certa provocação, pois, ainda que a sua oferta do aperto de mão tivesse sido menosprezada, sentiu-se cada vez mais independente de toda aquela gente, especialmente agora que o Inspector se tinha posto em pé. Estava positivamente a divertir-se à custa deles. Pensou em correr no seu encalço até à porta da frente quando partissem e desafiá-los para que o prendessem. Assim, voltou a dizer: «Como posso eu ir ao Banco se estou preso?» «Pois», respondeu-lhe o inspector, que já chegara à porta, «vejo bem que o senhor não me compreendeu. Com certeza que está preso, mas isso não impede que vá ao seu trabalho nem que faça a sua vida normal.» «E não estar preso não é assim tão mau», retorquiu K, dirigindo-se ao inspector.





Os capítulos deste livro