O Processo - Cap. 1: Capítulo 1 Pág. 12 / 183

«Nunca admiti que o fosse», disse o inspector. «Mas, nesse caso, não vejo que houvesse necessidade de me prestar tal informação», disse K., aproximando-se ainda mais. Os outros juntaram-se mais também. Estavam agora todos reunidos junto à porta. «Cumpri o meu dever », afirmou o Inspector. «Um estúpido dever», replicou K implacavelmente. «É natural», volveu o Inspector, «mas não vamos perder o nosso tempo com semelhantes argumentos. Supus que quisesse ir ao Banco. No entanto, como o senhor parece perito em trocadilhos, deixe-me acrescentar que não estou a obrigá-lo a ir ao Banco, apenas julguei que lá quisesse ir. Para facilitar isso e tornar a sua entrada o mais discreta possível, retive aqui estes três jovens, que são seus colegas, para ficarem à sua disposição.» «O quê?» gritou K., boquiaberto, a olhar para os três jovens. Estes anémicos, insignificantes, que em grupo miravam as fotografias, eram realmente funcionários do Banco, mas não seus colegas — isso era ir longe de mais e mostrava uma lacuna na omnisciência do Inspector, na medida em que eles até eram empregados subalternos do Banco. Como é que ele não reparou nisso? Devia ter ficado muito absorvido com o Inspector e com os guardas para não ter reconhecido os três sujeitos. O empertigado Rabensteiner sempre a baloiçar os braços, o louro Kullich de olhos encovados e Kaminer com aquele trejeito, um sorriso insuportável marcado por uma crónica contracção muscular. «Bom dia!», cumprimentou K. depois de uma pausa, estendendo a mão às três figuras, que se inclinaram respeitosamente. Anão vos reconheci. Bem, vamos então ao nosso trabalho?» Os três jovens, sorridentes, inclinaram a cabeça em sinal afirmativo, com um ar de ansiedade, como se tivessem estado todo o tempo à espera desta ordem, e, quando K. se voltou para ir buscar o chapéu que havia deixado no seu quarto, os três precipitaram-se, uns após outros, para ir buscá-lo, o que pareceu um pouco embaraçoso. K. manteve-se quieto, observando-os através das duas portas abertas; o indolente Rabensteiner, naturalmente, fechava a marcha com aquela preocupação de caminhar afectada e elegantemente. Kaminer foi quem entregou o chapéu a K., que teve de, a exemplo do que costumava fazer no Banco, tentar convencer-se de que o sorriso de Kaminer não era intencional e que, ainda que este quisesse, não conseguiria sorrir de outra maneira. Então, Frau Grubach, que não parecia ter tomado consciência do que se passava, abriu a porta da frente, a fim de permitir que o grupo todo passasse, e K. olhou de soslaio, como frequentemente fazia, para as tiras do avental que lhe vincava profundamente o corpo maciço.





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