O Processo - Cap. 3: Capítulo 3 Pág. 53 / 183

Uma rapariga cuja atenção deve ter sido despertada pelo tom de voz de K. apareceu e indagou: «Que deseja o senhor?» A uma certa distancia por detrás dela, K. conseguia divisar na semiobscuridade uma figura masculina a aproximar-se. K. olhou para o oficial de diligências. Este tinha-lhe dito que ninguém se preocuparia com ele e, afinal, já duas pessoas tinham procurado saber quem ele era. Não tardaria que todos os funcionários se lhe dirigissem a indagar a razão da sua presença ali. O único motivo compreensível e aceitável era testemunhar que era um réu e que vinha saber a data do seu próximo interrogatório. Contudo, não lhe apetecia fornecer tal explicação, tanto mais que tinha aqui vindo movido apenas por uma simples curiosidade ou, o que se tornava ainda uma explicação mais difícil da sua presença, pelo desejo de se certificar de que o interior do sistema legal era tão repugnante como o seu aspecto exterior. Até lhe parecia que esta asserção era bem fundamentada e por isso não iria fazer mais nenhumas investigações, sentindo-se já bastante abatido com o que havia visto. Neste momento, tão pouco estava em condições de enfrentar qualquer funcionário superior como os que deviam aparecer por detrás de uma destas portas, preferindo abandonar o lugar, ou com o oficial de diligências ou mesmo sozinho, se assim tivesse de ser.

Todavia, a sua imobilidade devia ser tão flagrante que a rapariga e o oficial de diligências ficaram a olhá-lo estupefactos, como se aguardassem que alguma transformação se operasse nesse momento, uma transformação que nenhum deles queria perder. Ao fundo do corredor, estava agora o homem que tinha visto à distancia: apoiava-se na padieira da entrada e balouçava-se levemente sobre os pés, como um espectador curioso. A rapariga, no entanto, foi a primeira a observar que o comportamento de K. era devido a uma pequena sensação de desfalecimento e, indo buscar-lhe uma cadeira, perguntou-lhe: «Não quer sentar-se?» K. sentou-se imediatamente e apoiou os cotovelos nos braços da cadeira de modo a sentir-se mais seguro. «Está um pouco tonto, não é verdade?», perguntou a rapariga. O seu rosto estava agora próximo do dele e exibia aquele aspecto grave que muitas mulheres têm nos seus primeiros anos de juventude. «Não se preocupe», acalmou-o ela, «não é nada fora do vulgar, pois quase toda a gente sente isso quando aqui entra pela primeira vez. Esta é a sua primeira visita? Bem, então não é nada de alarmar.





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