Ora essas torrentes luminosas, todas orientadas para o mesmo ponto quimérico do espaço, convergiam nele num turbilhão - e, desse turbilhão meteórico, é que elas realmente, em ricochete enclavinhado, se projetavam sobre paredes e colunas, se espalhavam no ambiente da sala, apoteotizando-a.
De forma que a luz total era uma projeção da própria luz - em outra luz, seguramente, mas a verdade é que a maravilha que nos iluminava nos não parecia luz. Afigurava-se-nos qualquer outra coisa - um fluido novo. Não divago; descrevo apenas uma sensação real: essa luz, nós sentíamo-la mais do que a víamos, E não receio avançar muito afirmando que ela não impressionava a nossa vista, mas sim o nosso tato. Se de súbito nos arrancassem os olhos, nem por isso nós deixaríamos de ver. E depois - eis o mais bizarro, o mais esplêndido - nós respirávamos o estranho fluido. Era certo, juntamente com o ar, com o perfume roxo do ar, sorvíamos essa luz que, num êxtase iriado, numa vertigem de ascensão - se nos engolfava pelos pulmões, nos invadia o sangue, nos volvia todo o corpo sonoro. Sim, essa luz mágica ressoava em nós, ampliando-nos os sentidos, alastrando-nos em vibratilidade, dimanando-nos, aturdindo-nos… Debaixo dela, toda a nossa carne era sensível aos espasmos, aos aromas, às melodias!…
E não foi só a nós, requintados de ultracivilização e arte, que o mistério rutilante fustigou. Pois em breve todos os espectadores evidenciavam, em rostos confundidos e gestos ansiosos, que um ruivo sortilégio os varara sob essa luz de além-Inferno, sob essa luz sexualizada.
Mas de súbito toda a iluminação se transformou divergindo num resvalamento arqueado: e outro frémito mais brando nos diluiu então, como beijos de esmeraldas sucedendo a mordeduras.
Uma