Uma manhã, entrando no meu quarto, desfechou-me:
- Sabe, meu caro Lúcio, apresentaram-me ontem uma americana muito interessante. Calcule, é uma mulher riquíssima que vive num palácio que propositadamente fez construir no local onde existiam dois grandes prédios que ela mandou deitar abaixo - isto, imagine você, em plena Avenida do Bosque de Bolonha! Uma mulher linda. Nem calcula. Quem me apresentou foi aquele pintor americano dos Óculos azuis. Recorda-se? Eu não sei como ele se chama… Podemo-la encontrar todas as tardes no Pavilhão de Armenonville. Costuma ir lá tomar chá. Quero que você a conheça. Vai ver. Interessantíssima!
No dia seguinte - uma esplêndida tarde de inverno, tépida, cheia de sol e céu azul -, tomando um fiacre, lá nos dirigimos ao grande restaurante. Sentamo-nos; mandou-se vir chá… Dez minutos não tinham decorrido, quando Gervásio me tocava no braço. Um grupo de oito pessoas entrava no salão - três mulheres, cinco homens. Das mulheres, duas eram loiras, pequeninas, de pele de rosas e leite; de corpos harmoniosos, sensuais - idênticas a tantas inglesas adoráveis. Mas a outra, em verdade, era qualquer coisa de sonhadamente, de misteriosamente belo. Uma criatura alta, magra, de um rosto esguio de pele dourada - e uns cabelos fantásticos, de um ruivo incendiado, alucinante. A sua formosura era uma destas belezas que inspiram receio. Com efeito, mal a vi, a minha impressão foi de medo - de um medo semelhante ao que experimentamos em face do rosto de alguém que praticou uma ação enorme e monstruosa.
Ela sentou-se sem ruído; mas logo, vendo-nos, correu estendendo as mãos para o escultor:
- Meu caro, muito prazer em o encontrar… Falaram-me ontem muito bem de si… Um seu compatriota… um poeta… M. de Loureiro, julgo…
Foi difícil adivinhar o apelido português entre a pronúncia mesclada.