Mas lembrei-me de ver estas ruas novas… Ando tão aborrecido…
- Do calor?
- Não… E tu próprio… diz-me… Nunca costumas sair de manhã… sobretudo aos domingos…
- Ah! uma madureza como outra qualquer. Concluí agora mesmo uns versos E na ânsia de os ler a alguém, ia a casa do Sérgio Warginsky para lhos mostrar… É aqui perto… Anda comigo… Fazemos horas para o almoço.
A estas palavras todo eu tremi num arrepio. Silencioso, pus-me a acompanhá-lo, maquinalmente.
O artista quebrou o silêncio:
- Então, e a tua peça?
- Terminei-a a semana passada.
- O quê!? Mas ainda não me tinhas dito coisa alguma!…
Desculpei-me, murmurando:
- É que me esqueci, talvez…
- Homem! tens cada resposta que não lembra ao diabo!… - recordo-me perfeitamente de que ele exclamara, rindo. E prosseguiu:
- Mas conta-me depressa… Estás satisfeito com a tua obra?… Como resolveste afinal aquela dificuldade do segundo ato? O escultor sempre morre?… E eu:
- Resolve-se tudo muito bem. O escultor…
Chegáramos defronte do prediozinho verde. Interrompi-me de súbito…
Não! não era ilusão: em face de nós, no outro passeio, Marta sempre nos seus passos leves, indecisos mas rápidos, silenciosos - sem nos ver, sem reparar em redor de si, dirigia-se ao prédio misterioso, batia à porta desta vez, entrava…
E, ao mesmo tempo, apertando-me o braço bruscamente, dizia-me o poeta:
- No fim de contas é um disparate irmos incomodar o russo. O que eu estou é ansioso por conhecer o teu drama. Vamos buscá-lo os dois a tua casa. Quero ouvi-lo esta tarde. Tanto mais que o automóvel precisa conserto. Aquilo, dia sim dia não, é uma peça que se parte…
* * *
Vivi todo o resto desse dia como que envolto num denso véu de bruma. Entanto pude ler o meu drama a Ricardo e a Marta.