Eu pensava que nunca chegaria a Paris, que era impossível haver triunfado, que sonhava com certeza - ou então que me prenderiam no caminho por engano: que me obrigariam a tornar a Lisboa, que vinham no meu encalço Marta, Ricardo, todos os meus amigos, todos os meus conhecidos…
E um calafrio de horror me ziguezagueara ao ver entrar em Biarritz um homem alto e louro, no qual, de súbito, eu julguei reconhecer Sérgio Warginsky. Mas olhando-o melhor - olhando-o pela primeira vez realmente - sorri para mim próprio: o desconhecido apenas tinha do conde russo o ser alto e louro…
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Entanto agora já não podia duvidar: vencera. Atravessara a Praça da Concórdia, monumental e aristocrática, tilintante de luzes…
De novo, ungindo-me de Europa, alastrando-me da sua vibração, se encapelava dentro de mim Paris - o meu Paris, o Paris dos meus vinte e três anos…
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E foram então os últimos seis meses da minha vida… Vivi-os de existência diária, em banalidade, frequentando os cafés, os teatros, os grandes restaurantes…
Nas primeiras semanas - e mesmo depois, numa ou noutra hora - ainda pensei no meu caso, mas nunca embrenhadamente.
Afinal - pressentia - tudo aquilo, no fundo, era talvez bem mais simples do que se me afigurava. O mistério de Marta? Ora… ora… Fazem-se tantas loucuras… há tantas aventureiras…
E parecia-me até que, se eu quisesse, num grande esforço, numa grande concentração, poderia explicar coisa alguma, esquecer tudo. Esquecer é não ter sido. Se eu lograsse abolir o triste episódio da minha recordação, era exatamente como se nunca o existira. E foi pelo que me esforcei.
Entretanto nunca podia deixar de pensar numa circunstância: a complacência inaudita de Ricardo - a sua infâmia. E então as coisas haviam chegado a ponto de a sua mulher ir atrás dele, quase com ele, a casa de um amante? Pois se nós a não víramos, ela, por mais distraída que caminhasse, tinha-nos visto com certeza.