O Retrato de Dorian Gray - Cap. 8: Capítulo 8 Pág. 131 / 335

- O quê? - perguntou ele agastado.

- Por que representei hoje mal. Por que hei-de sempre representar mal. Por que nunca mais hei-de representar bem.

Ele encolheu os ombros.

- Estás doente, creio. Quando estás doente não devias representar. Tornas-te ridícula. Os meus amigos estavam aborrecidíssimos, e eu também.

Ela parecia não lhe dar ouvidos. Achava-se transfigurada de alegria. Dominava-a um êxtase de ventura.

- Dorian, Dorian - exclamou - antes de te conhecer, representar era a única realidade da minha vida. Era só no teatro que eu vivia. Pensava que era tudo verdade. Era Rosalinda uma noite e Pórcia na outra. A alegria de Beatriz era a minha alegria e as mágoas de Cordélia eram as minhas também. Acreditava em tudo. A gente vulgar que representava comigo parecia-me da essência dos deuses. O meu mundo eram cenários pintados. Apenas conhecia sombras e julgava-as reais. Vieste tu - oh, meu belo amor! - e libertaste a minha alma da prisão. Ensinaste-me o que a realidade é realmente. Hoje, pela primeira vez na minha vida, compreendi o vazio de todo este absurdo e inepto artifício em que sempre tinha representado. Hoje, pela primeira vez, tive consciência de que Romeu era hediondo, velho e pintado, que o luar no pomar era falso, que o cenário era vulgar e reles e que as palavras que eu tinha de proferir eram fictícias, não eram palavras minhas, não eram o que eu queria dizer.





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