- Não precisamos mais dele, mãe. O Príncipe Encantador olhará por nós agora.
Dizendo estas palavras, deteve-se. Sacudiu-lhe o sangue um rubor, que lhe incendiou as faces. Um respirar mais apressado entreabriu-lhe as pétalas dos lábios, que tremeram. Perpassou por ela um vento sul de paixão que lhe agitou as pregas graciosas do vestido.
- Amo-o! - disse, singelamente.
- Tolinha! Tolinha! - respondeu-lhe a velha, numa voz que mais parecia de papagaio.
Os dedos recurvos e cheios de anéis de pedras falsas acompanhavam estas palavras dum gesto que mais grotescas ainda as tornava.
A rapariga tornou a rir-se. Bailava-lhe na voz a alegria dum pássaro na gaiola. Irradiava-lhe dos olhos uma melodia; cerrou-os por um momento, como que para ocultar um segredo. Quando de novo os abriu, velava-os a neblina dum sonho.
Da velha cadeira vinham-lhe conselhos de prudência, extraídos daquele livro de cobardia, cujo autor se mascara com o nome de senso comum. Ela não os escutava. Era livre na cadeia da sua paixão. O seu príncipe, o Príncipe Encantador, estava com ela. Apelara para a memória para o reconstituir. Enviara a sua alma em procura dele e ela trouxera-lho. O beijo dele ardia-lhe de novo nos lábios. Ainda sentia nas pálpebras o calor do seu hálito.