Achas que haveria pessoas que, depois de ouvirem estas palavras, preferissem fazer a guerra a cães sólidos e vigorosos, em vez de a fazerem, com a ajuda desses cães, a carneiros gordos e tenros?
- Não creio. Mas, se numa única cidade se acumulam as riquezas das outras, toma sentido que isso não constitua um perigo para a cidade que não é rica.
- És feliz - disse eu - em acreditares que outra cidade diferente da que fundámos merece tal nome!
- Porque não? - inquiriu.
- É - respondi - um nome de significação mais vasta que é preciso dar às outras cidades, porque cada uma delas é múltipla, e não uma, como se diz no jogo; encerra, pelo menos, duas cidades inimigas uma da outra: a dos pobres e a dos ricos, e cada uma delas subdivide-se em várias outras.
Se as considerares como formando uma só, ficarás completamente decepcionado, mas, se as tratares como múltiplas, dando a umas as riquezas, os poderes ou mesmo as pessoas das outras, terás sempre muitos aliados e poucos inimigos. E, enquanto a tua cidade for sabiamente administrada, como acabamos de estabelecer, será a maior de todas, não digo em fama, mas a maior na realidade, ainda que composta apenas por mil guerreiros; com efeito, não encontrarás facilmente uma cidade tão grande nem entre os Gregos nem entre os Bárbaros, embora haja muitas que parecem ultrapassá-la várias vezes em grandeza. Pensas de modo diferente?
- Não, por Zeus! - exclamou.
- Nesse caso, eis o mais belo limite que os nossos guardas podem dar ao desenvolvimento da cidade; tendo limitado de forma proporcionada o território, abandonarão o resto.
- Qual é esse limite?
- Julgo - respondi - que é este: até ao ponto em que, aumentada, conserva a sua unidade, a cidade pode estender-se, mas não para além disso.
-Muito bem.
- Portanto, prescreveremos também aos guardas que zelem com o maior cuidado por que a cidade não seja aparentemente nem pequena nem grande, mas por que seja de proporções suficientes, conservando ao mesmo tempo a sua unidade.
- E talvez isso não passe - disse ele - de uma prescrição sem importância!
- Menos importante ainda - repliquei - é a que mencionámos há pouco, quando dissemos que era preciso relegar para as outras classes a criança medíocre nascida dos guardas e elevar à condição de guarda a criança bem dotada nascida nas outras classes.