- É forçoso que sejam libertos de todos esses males.
- Além disso, nenhuma acção por violência ou vias de facto será legitimamente intentada entre eles; com efeito, dir-lhes-emos que é nobre e justo que iguais se defendam contra os seus iguais e levá-los-emos a velar pela sua segurança pessoal.
- Está certo - disse ele.
- Esta lei - prossegui - tem ainda a seguinte vantagem: quando um cidadão se irritar com outro, se acalmar a sua cólera desta maneira, será menos propenso, em seguida, a agravar o diferendo.
- Sem dúvida.
- Teremos dado ao mais velho autoridade sobre todo aquele que seja mais novo, com o direito de punir.
- É evidente.
- Também é evidente que os jovens não tentarão, sem uma autorização dos magistrados, usar de violência para com homens mais velhos, nem feri-los; também não os ultrajarão de qualquer outra maneira, creio eu, porquanto dois guardas bastarão para os impedir: o medo e o respeito; o respeito, mostrando-lhes um pai na pessoa que querem ferir, o medo, fazendo-lhes compreender que os outros irão em socorro da vítima, estes na qualidade de filhos, aqueles na qualidade de irmãos ou pais.
- Não pode ser de outro modo.
- Assim, graças às nossas leis, os guerreiros gozarão entre si de uma paz perfeita.
- De uma grande paz, sem dúvida.
- Mas, se viverem em concórdia, não é de recear que a discórdia se interponha entre eles e os outros cidadãos ou que divida estes?
- Por certo que não.
- Quanto aos males menores de que estarão isentos, hesito, por respeito pelas conveniências, em mencioná-los: pobres, não se verão na necessidade de lisonjear os ricos; não conhecerão as dificuldades e os aborrecimentos que há em criar filhos, em juntar fortuna, e que resultam da obrigação de, para isso, terem de sustentar escravos; não terão de pedir emprestado, nem de renegar as dívidas, nem de conseguir dinheiro por todos os meios para o porem à disposição de mulheres e servidores, confiando-lhes o cuidado da casa: enfim, meu amigo, ignorarão todos os mal que se suportam nestes casos - males evidentes, sem nobreza e indignos de ser citados.
- Sim, são evidentes, mesmo para um cego.
- Ficarão livres de todas essas misérias e levarão uma vida mais feliz que a vida bem-aventurada dos vencedores olímpicos.
-Como?
- Estes só gozam uma pequena parte da felicidade reservada aos nossos guerreiros.