— Se, como dizias há pouco, a justiça for sabedoria, recorrerá a ela; mas, se for como eu dizia, empregará a injustiça.
— Estou encantado, Trasímaco, por não te contentares em aprovar ou desaprovar com um gesto de cabeça e responderes tão bem.
— E — disse ele — para te dar prazer.
— Muito amável da tua parte. Mas faz-me o favor de responder ainda a isto: achas que uma cidade, um exército, um bando de salteadores ou de ladrões, ou qualquer outra sociedade que persegue em comum um objectivo injusto, poderia levar a bom termo qualquer empresa se os seus membros violassem entre si as regras da justiça?
— Por certo que não — confessou.
— Mas se as observassem? Não seria melhor?
— Com certeza.
— Com efeito, Trasímaco, a injustiça faz nascer entre os homens dissensões, ódios e lutas, ao passo que a justiça alimenta a concórdia e a amizade. Não é?
— Assim seja! — disse ele. — Não quero entrar em contenda contigo.
— Estás a portar-te muito bem, excelente homem. Mas responde a esta pergunta se é próprio da injustiça engendrar o ódio por toda a parte onde se encontra, aparecendo em homens livres ou escravos, não fará que se odeiem, lutem entre si e sejam impotentes para empreender seja o que for em comum?
— Sem dúvida.