Ou dos que fazem o contrário?
- De que estás a falar?
- Da rudeza e dureza de uns, da moleza e brandura dos outros.
- Sim, notei que os que se entregam a uma ginástica sem mistura contraem demasiada rudeza e que os que cultivam exclusivamente a música se tornam mais moles do que o permitiria a decência.
- E, no entanto, é o elemento generoso da sua natureza que provoca a rudeza; bem dirigido, tornar-se-ia coragem, mas, demasiado tenso, degenera em dureza e mau humor, como é natural.
- Assim me parece.
- Mas quê? E a brandura, não faz parte do carácter filosófico? Demasiado frouxa, amolece-o mais do que o permitido, mas, dirigida, abranda-o e ordena-o.
- É isso.
- Ora, é preciso; dizemos nós, que os nossos guardas reúnam estas duas características.
- Assim é, com efeito.
- Não devemos, então, pô-las de harmonia uma com a outra?
- Sem dúvida.
- E a sua harmonia não torna a alma moderada e corajosa?
- Inteiramente.
- Ao passo que o seu desacordo a torna cobarde e grosseira?
- Com certeza.
- Portanto, se um homem permite que a música o encante ao som da flauta e lhe derrame na alma, pelo canal dos ouvidos, essas harmonias suaves, moles e plangentes de que falávamos há pouco, se passa a vida a trautear, exultante de alegria pela beleza do canto: em primeiro lugar, suaviza o elemento irascível da sua alma, como o fogo amolece o ferro e o torna útil, de inútil e duro que era antes; mas, se continua a entregar-se ao encanto, a sua coragem não tarda a dissolver-se e a fundir-se, até se reduzir a nada, até ser extraída, como um nervo, da sua alma, deixando-o «guerreiro sem vigor».
- É inteiramente verdade - disse ele.
- E, se recebeu da natureza uma alma sem coragem, este resultado não se faz esperar; se, pelo contrário, nasceu ardente, o seu coração enfraquece-se, torna-se impressionável e predisposto, por frioleiras, a irritar-se e a acalmar-se. Em vez de corajoso, ei-lo irritável, colérico e cheio de mau humor.
- Com toda a certeza.
- Por outro lado, que sucede se se entrega inteiramente à ginástica e à boa mesa, sem se importar com a música e a filosofia? Em primeiro lugar, o sentimento das suas forças não o enche de orgulho e coragem e não se torna mais valente do que era?
- Certamente.
- Mas se não fizer mais nada e não tiver comércio com a Musa?