Por vezes uma mãe empurrava o seu lobito bem para o luar, para ter a certeza de que não o tinham passado em claro. Do seu rochedo, Àquêlà bradava:
- Conheceis a lei, vós conheceis a lei. Reparai bem, ó lobos!
E as mães, ansiosas, repetiam o brado:
- Reparai, reparai bem, ó lobos!
Por fim - e as cerdas do pescoço de Mãe Loba retesaram-se ao chegar o momento - Pai Lobo empurrou Máugli, a rã, como lhe chamavam, para o centro, onde ficou sentado a rir e a brincar com uns seixos que reluziam ao luar.
Àquêlà não levantou a cabeça das patas, mas continuou com brado monótono:
- Reparai bem!
Ouviu-se por detrás do rochedo um rugido abafado; a voz de Xer Cane bradando:
- O cachorro é meu. Entregai-mo. Que tem a gente livre que fazer com um cachorro de homem? - Àquêlà nem sequer mexeu as orelhas e disse apenas:
- Reparai bem, ó lobos! Que tem a gente livre que ver com as ordens de quem quer que seja, senão do povo livre? Reparai bem!
Seguiu-se um coro de rosnadelas fundas, e um jovem de quatro anos arremessou de novo a pergunta de Xer Cane a Àquêlà:
- Que tem a gente livre que ver com um cachorro de homem?
Ora a Lei da Selva preceitua que, havendo qualquer disputa sobre o direito de um lobito ser aceite pela alcateia, precisa de ser defendido pelo menos por dois membros da alcateia que não sejam seu pai nem sua mãe.
- Quem defende este cachorro? - perguntou Àquêlà. Entre a gente livre quem fala por ele? - Ninguém respondeu, e Mãe Loba preparou-se para o que sabia ser o seu último combate, se fosse preciso bater-se.
Então o único animal estranho admitido no Conselho da Alcateia - Bálu, o urso pardo sonolento, que ensina aos lobitos a Lei da Selva, o velho Bálu que pode andar por onde lhe apetece, porque não come senão nozes, mel e raízes - ergueu-se sobre as patas traseiras e grunhiu:
- O cachorro de homem? O cachorro de homem? - disse.