- Estou todo molhado. Ah, sim, já me recordo.
O medo apareceu-lhe nos olhos; ocultou o rosto nas mãos.
- Como caiu à água?
- Não caí.
-Como?
- Fui atirado à agua. Encontrava-me na margem; fui
erguido cornourna pena por trás e precipitado no ribeiro. Não vi nada. Não ouvi nada. Mas sei, apesar disso, de que se trata. - Eu também! - murmurou Smith.
Lee deitou-lhe um relance de olhos espantado.
- Está então ao corrente? Lembra-se do conselho que lhe dei?
- Sim, e começo a pensar que vou segui-lo.
- Não entendo nada do que estão a falar - disse Hastie -, mas se eu fosse a si, Harringron, obrigaria Lee a deitar-se imediatamente. Haverá tempo para discutir o porquê e o como quando ele tiver recuperado as forças. Penso, Smith, que podemos deixá-lo sozinho, agora. Eu volto para o colégio; se forem nesta direcção, poderemos conversar um bocadinho.
A conversa foi breve. Smith achava-se demasiado preocupado com os incidentes da noite: a ausência da múmia no salão do seu vizinho, o roçagar que sentira na escada, a reaparição inexplicável, extraordinária, da sinistra múmia, e depois aquela agressão contra Lee que se assemelhava tão estranhamente à precedente agressão contra Norron (dois inimigos de Bellingham). Mexia e remexia estes elementos na sua cabeça, assim corno os inúmeros pequenos pormenores que o haviam indisposto contra o seu vizinho e as circunstâncias pouco banais que o tinham constrangido a ir a casa dele pela primeira vez. Aquilo que fora uma suspeita vaga, íantasista, assumia subitamente corpo, apresentava-se-lhe ao espírito sob a forma de um facto indesmentível. No entanto, que facto monstruoso! Um facto sem precedentes! Para além de todas as possibilidades humanas. Um juiz imparcial, e mesmo o amigo que o acompanhava, diria simplesmente que os seus olhos o tinham iludido, que a múmia não deixara nunca de permanecer na caixa, que o jovem Lee caíra por descuido à água e que as pílulas azuis eram um excelente remédio para o fígado desarranjado.
