O Dia em que o Mundo Acabou - Cap. 4: Capítulo 4 Pág. 49 / 72

Summerlee adormeceu na cadeira, e de vez em quando ressona de uma forma peculiarmente exasperante. Lorde John está recostado com as mãos nos bolsos, e os olhos fechados. Para mim é inconcebível que as pessoas possam dormir em tais condições.

Três e trinta de madrugada. Acabo de acordar, sobressaltado. Eram onze e cinco quando escrevi a última coisa. Lembro-me de ter tirado o relógio para anotar as horas. Por isso desperdicei aproximadamente cinco horas das poucas que ainda nos restam. Quem acreditaria que era possível? Mas sinto-me muito mais fresco, e pronto para o meu destino - ou tento persuadir-me de que estou. E, no entanto, quanto mais saudável um homem é, e quanto mais alta a sua maré da vida, mais deve fugir da morte. Como é sábia e misericordiosa a provisão da Natureza graças à qual a sua âncora terrestre é normalmente solta com muitos pequenos puxões imperceptíveis, até a sua consciência nos levar para fora deste porto terrestre insustentável, para o grande mar para além dele!

A Sr.ª Challenger ainda está no quarto de vestir. Challenger adormeceu na sua cadeira. Que figura! O seu enorme corpo está recostado para trás, as suas mãos enormes e peludas estão apertadas por cima da sua cintura, e a cabeça está tão inclinada que não se vê nada acima da garganta a não ser uma amálgama emaranhada de uma barba luxuriante. Treme com a vibração do próprio ressonar. Summerlee acrescenta o seu tenor alto ocasional ao sonoro baixo de Challenger. Lorde John também está a dormir, com o seu corpo comprido enroscado de lado numa cadeira de verga. A primeira luz fria da alvorada começa a aventurar-se na sala, e tudo está cinzento e triste.

Olho lá para fora, para ver o nascer do Sol - aquele nascer do Sol fatídico que brilhará num mundo sem pessoas. A raça humana desapareceu, extinta num dia, mas o planeta continua a rodar e as marés sobem ou descem, e o vento sussurra, e toda a Natureza segue o seu curso, até, como parece, à própria ameba, sem um único sinal de que aquele que se denominou o senhor da criação alguma vez abençoou ou amaldiçoou o universo com a sua presença. Lá em baixo no pátio, Austin está estendido com os braços e as pernas abertos, com a brancura do rosto a brilhar na alvorada, e a agulheta da mangueira ainda a projectar-se da sua mão morta. Toda a raça humana está tipificada naquela figura meio ridícula e meio patética, tão indefesa ao lado da máquina que costumava controlar.

Aqui terminam as notas que eu fiz na altura. Depois deste momento os acontecimentos foram demasiado rápidos e pungentes para me permitirem escrever, mas estão muito claramente delineados na minha memória e nenhum pormenor poderia escapar-me.





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