O Dia em que o Mundo Acabou - Cap. 5: Capítulo 5 Pág. 58 / 72

Agora sentíamos a sua falta. Este silêncio mortal era aterrador. Era tão solene, tão impressionante, que o ruído do nosso automóvel parecia uma intrusão injustificável, uma indiferença indecente desta imobilidade reverente que jazia como um pano mortuário sobre e em volta das ruínas da humanidade. Foi este gemido sombrio, e as nuvens altas de fumo que se erguiam aqui e ali, desprendendo-se dos edifícios que ardiam lentamente, que provocaram um arrepio nos nossos corações enquanto olhávamos em volta para o panorama glorioso do Weald.

E depois havia os mortos! No começo, aqueles grupos infinitos de rostos distorcidos e sorridentes encheram-nos de um horror trémulo. A impressão era tão vívida e mordaz que posso reviver vezes sem conta aquela descida lenta para a colina da estação, a passagem pela jovem ama com os dois bebés, a visão do velho cavalo de joelhos entre os varais, o carroceiro torcido no seu assento, e o jovem no interior com a mão na porta aberta no acto de sair. Mais abaixo, havia seis ceifeiros numa liteira, com os membros cruzados, os olhos mortos e sem pestanejar a olhar para cima, para o brilho do céu. Vejo estas coisas como se estivesse a observar uma fotografia. Mas em breve, graças à providência misericordiosa da Natureza, o nervo sobre excitado deixou de reagir. A própria vastidão do horror apagou o seu apelo pessoal. Os indivíduos fundiram-se em grupos, os grupos em multidões, as multidões num fenómeno universal que depressa foi aceite como o pormenor inevitável de cada cena. Apenas aqui e ali, quando algum incidente particularmente brutal ou grotesco prendia a atenção, é que a mente voltava com um choque súbito para o significado pessoal e humano de tudo aquilo.

Acima de tudo estava o destino das crianças. Recordo-me de que isso nos encheu com a sensação fortíssima de injustiça intolerável. Podíamos ter chorado - a Sr.ª Challenger chorou - quando passámos pela grande escola municipal e vimos o longo trilho de figuras minúsculas espalhadas pela rua que dava acesso ao edifício. Tinham sido dispensadas pelos professores, e corriam para casa quando o veneno as apanhara na sua rede. Grandes quantidades de pessoas estavam às janelas abertas das casas. Em Tunbridge Wells não havia praticamente ninguém que não tivesse um rosto expectante e sorridente. No último instante, a necessidade de ar, aquela necessidade de oxigénio que apenas nós tínhamos conseguido satisfazer, levara-os a voar para a janela. Também os passeios estavam repletos de homens e mulheres, sem chapéus e gorros, que tinham saído de casa. Muitos deles tinham caído na estrada. Foi uma sorte termos encontrado em Lorde John um condutor exímio, pois não era fácil escolher o caminho.





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