A República - Cap. 7: Capítulo 7 Pág. 213 / 290

- Necessariamente, não os respeitará, nem já lhes obedecerá da mesma maneira.

- Mas - prossegui -, quando já não acreditar, como antes, que estes princípios são dignos de respeito e aparentados com a sua alma, sem, contudo, ter descoberto os verdadeiros princípios, será possível que chegue a um género de vida diferente do que o lisonjeia?

- Não, não é possível- respondeu.

- Portanto, vê-lo-emos, creio eu, tornar-se rebelde às leis, de submisso que era.

- Necessariamente.

- Assim, é muito natural o que acontece às pessoas que se dedicam à dialéctica e, como eu dizia há pouco, merecem que se lhes perdoe.

- E que as lamentemos - acrescentou.

- A fim de não expormos a essa compaixão os teus homens de trinta anos, não devemos tomar todas as precauções possíveis antes de os consagrarmos à dialéctica?

- Sim, com certeza - disse ele.

- Ora, não é uma precaução importante impedi-los de saborear a dialéctica enquanto são novos? Deves ter notado, julgo eu, que os adolescentes, depois de terem saboreado uma vez a dialéctica, abusam a fazem dela um jogo, usam-na para contestar a todo o momento e, imitando os que os refutam, refutam os outros por sua vez e sentem prazer, como jovens cães, em assediar e dilacerar pelo raciocínio todos os que deles se aproximam.

- Sim, sentem com isso um prazer maravilhoso.

- Depois de terem refutado muitas vezes os outros e de terem sido refutados muitas vezes também, depressa acabam por já não acreditar em nada do que acreditavam antes; e, assim, eles e toda a filosofia ficam desacreditados na opinião pública.

- Nada mais verdadeiro.

- Mas um homem mais velho não quererá cair em semelhante mania; imitará aquele que quer discutir e procurar a verdade, e não o que se diverte e contesta por prazer; será mais ponderado e tornará a profissão dialéctica mais honrosa em vez de a rebaixar.

- É exacto - disse ele.

- E não era o mesmo espírito de precaução que nos fazia dizer atrás que não se devia admitir nos exercícios da dialéctica senão caracteres ordenados e firmes e que não se devia, como agora, deixar aproximar dela um qualquer que para tal não revele a mínima inclinação?

- Sim, era - respondeu.

- Portanto, o estudo da dialéctica, quando nos entregamos a ele sem descanso e com ardor, com exclusão de qualquer outro trabalho, como se fazia para os exercícios do corpo, não exigirá muito mais do que o dobro dos anos consagrados a estes.





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