O Garimpeiro - Cap. 3: III- NA ROÇA Pág. 25 / 147

A perspectiva que tinham em frente era magnífica: a vista se perdia por vastas e risonhas Campinas e remotos horizontes, banhados pela luz de um sol esplêndido. E por entre a algazarra dos melros, pintassilgos e patativas, que chilravam em torno da casa, e os gorjeios cadenciados do sabiá que cantava ao longe, ouviam-se os ensaios tímidos daquelas duas vozes infantis. Era de sobejo para encantar e exaltar a imaginação impressionável do mancebo, que nessas horas de doce ocupação esquecia-se de si, de sua pobreza, do seu futuro, para se entregar ao enlevo do mais puro e do mais ideal dos amores. As duas alunas também, por sua parte, e principalmente Lúcia, tinham aquelas horas pelas mais bem empregadas da sua vida. Mas Elias já tinha lido a “Júlia” de João Jacques Rousseau, e no meio de suas doces emoções às vezes estremecia ao lembrar-se da sorte dos dois amantes no romance do imortal filósofo de Genebra.

O contato íntimo daqueles dois corações, que pareciam criados um para o outro, acabou de abrasa-los em uma paixão enérgica e profunda, dessas que não se extinguem senão com a vida. No seio da solidão as paixões tomam maior vulto e se enraízam mais na alma, do que no meio do bulício e das distrações do mundo. A alma solitária é como a fonte do deserto, resguardada dos ventos, que no regaço límpido e imóvel guarda fielmente a imagem do arvoredo que a sombreia.

Lúcia e Elias amavam-se; todavia nem uma só palavra de amor lhes havia ainda escapado dos lábios; os olhares e os sorrisos diziam tudo; eles sabiam muito bem que se amavam, e era quanto bastava para sua felicidade. Como dois cisnes, deixavam-se levar descuidosamente pela torrente plácida e voluptuosa das emoções presentes, sem se lembrarem que mais além podiam ser arrastados e despedaçados por furiosas cachoeiras, ou engolidos em trevos sorvedouros.





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