Baixou a voz, apontando para o maestro, que caminhava adiante, enlevado:
- Tem muito talento, tem muita ideia melódica!... Olha que andei com aquilo às cabritas... E a mãe, menino, foi muitíssimo boa mulher.
- Vejam vocês isto! gritou Cruges que parara, esperando-os. Isto é sublime.
Era apenas um bocadito de estrada, apertada entre dois velhos muros cobertos de hera, assombreada por grandes árvores entrelaçadas, que lhe faziam um toldo de folhagem aberto à luz como uma renda: no chão tremiam manchas de sol: e, na frescura e no silêncio, uma água que se não via ia fugindo e cantando.
- Se tu queres sublime, Cruges, exclamou Alencar, então tens de subir à serra. Aí tens o espaço, tens a nuvem, tens a arte...
- Não sei, talvez goste mais disto, murmurou o maestro.
A sua natureza de tímido preferiria, decerto, estes humildes recantos, feitos de uma pouca de folhagem fresca e de um pedaço de muro musgoso, lugares de quietação e de sombra, onde se aninha com um conforto maior o cismar dos indolentes...
- De resto, filho, continuou Alencar, tudo em Sintra é divino. Não há cantinho que não seja um poema... Olha, ali tens tu, por exemplo, aquela linda florinha azul... - e, ternamente, apanhou-a.
- Vamos andando, vamos andando, murmurou Carlos impaciente, e agora, desde que o poeta falara do cãozinho de luxo, mais certo de que ela estava na Lawrence, e que a ia brevemente encontrar.
Mas, ao chegar a Sitiais, Cruges teve uma desilusão diante daquele vasto terreiro coberto de erva, com o palacete ao fundo, enxovalhado, de vidraças partidas, e erguendo pomposamente sobre o arco, em pleno céu, o seu grande escudo de armas. Ficara-lhe a ideia, de pequeno, que Sitiais era um montão pitoresco de rochedos, dominando a profundidade de um vale; e a isto misturava-se vagamente uma recordação de luar e de guitarras... Mas aquilo que ele ali via era um desapontamento.
- A vida é feita de desapontamentos, disse Carlos. Anda para diante!