Os Maias - Cap. 18: Capítulo 18 Pág. 608 / 630

Os políticos hoje eram bonecos de engonços, que faziam gestos e tomavam atitudes porque dois ou três financeiros por traz lhes puxavam pelos cordéis... Ainda assim podiam ser bonecos bem recortados, bem envernizados. Mas qual! Aí é que estava o horror. Não tinham feitio, não tinham maneiras, não se lavavam, não limpavam as unhas... Coisa extraordinária, que em país algum sucedia, nem na Roménia, nem na Bulgária! Os três ou quatro salões que em Lisboa recebem todo o mundo, seja quem for, largamente, excluem a maioria dos políticos. E porque? Porque as senhoras têm nojo!

- Olha o Gouvarinho! Vê lá se ele recebe às terças-feiras os seus correligionários...

Carlos que sorria, encantado com aquela veia acerba do Ega, saltou na cadeira:

- É verdade, e a Gouvarinho, a nossa boa Gouvarinho?

Ega, passeando pela sala, deu as novas dos Gouvarinhos. A condessa herdara uns sessenta contos de uma tia excêntrica que vivia a Santa Isabel, tinha agora melhores carruagens, recebia sempre às terças-feiras. Mas sofria uma doença qualquer, grave, no fígado ou no pulmão. Ainda elegante todavia, muito séria, uma terrível flor de pruderie... Ele, o Gouvarinho, aí continuava, palrador, escrevinhador, politicote, impertigadote, já grisalho, duas vezes ministro, e coberto de grã-cruzes...

- Tu não os viste em Paris, ultimamente?

- Não. Quando soube fui-lhes deixar bilhetes, mas tinham partido na véspera para Vichy...

A porta abriu-se, um brado cavo ressoou:

- Até que enfim, meu rapaz!

- Oh Alencar! gritou Carlos, atirando o charuto.

E foi um infinito abraço, com palmadas arrebatadas pelos ombros, e um beijo ruidoso - o beijo paternal do Alencar, que tremia, comovido. Ega arrastara uma cadeira, berrava pelo escudeiro:

- Que tomas tu, Thomaz? Cognac? Coração? Em todo o caso café! Mais café! Muito forte, para o Sr. Alencar!

O poeta, no entanto, abismado na contemplação de Carlos, agarrara-o pelas mãos, com um sorriso largo, que lhe descobria os dentes mais estragados. Achava-o magnifico, varão soberbo, honra da raça... Ah! Paris, com o seu espírito, a sua vida ardente, conserva...





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