O Processo - Cap. 7: Capítulo 7 Pág. 126 / 183

Na absolvição definitiva, os documentos relativos ao processo são completamente eliminados, desaparecem simplesmente, não só a acusação de culpa como o arquivo do processo e até mesmo a absolvição são destruídos. O mesmo não acontece com a absolvição aparente. Os documentos conservam-se no mesmo sítio e só o requerimento é apenso aos mesmos juntamente com a absolvição e as razões que a originaram. O dossier completo circulará de acordo com as exigências rotineiras, seguindo para o Supremo Tribunal, deste novamente para os tribunais inferiores e andando para trás e para diante, sujeito as maiores ou menores oscilações, aos maiores ou menores atrasos. Estas viagens são imprevisíveis. Alguém que estivesse de fora a observar o facto imaginaria que todo o processo teria sido esquecido, os documentos perdidos e que a absolvição estaria completa. Ninguém relacionado com o tribunal poderia alguma vez pensar numa coisa dessas, na medida em que um documento jamais se perde e que o tribunal nunca esquece nada. Um dia, inesperadamente, um dos juízes pegará nos documentos e estudá-los-á com toda a atenção, reconhecendo que, neste processo, a acusação ainda é válida, pelo que emitirá uma ordem de captura imediata. Tenho estado a falar na suposição de que decorra muito tempo entre a absolvição aparente e a nova ordem de captura; isso é possível e até conheço casos desses, mas é da mesma maneira possível que o indivíduo absolvido, ao dirigir-se a casa após abandonar o tribunal, encontre lá à sua espera funcionários judiciais para o deterem de novo. É claro que então toda a sua liberdade cessa ali.» «E o processo recomeça?», inquiriu K., quase incrédulo. «Evidentemente», respondeu o pintor. «O processo recomeça, mas é outra vez possível, tal como antes, garantir uma absolvição aparente. É chegada a altura de reunir todas as energias para continuar com o processo e dá maneira nenhuma ceder.» Pronunciou estas palavras certamente por ter notado que K. parecia um tanto desanimado. «Mas», disse K., como se quisesse antecipar-se a qualquer segredo que o pintor fosse revelar, «não será mais difícil obter a segunda absolvição do que a primeira?» «Sobre esse ponto», afirmou o pintor, «não há nada de concreto. O senhor quer dizer que a segunda prisão vai influenciar os juízes contra o acusado? De maneira nenhuma. Até mesmo enquanto estão a conceder a primeira absolvição, os juízes prevêem a possibilidade de uma nova captura. Por conseguinte, tal facto raramente se discute. Por razões diversas, contudo, pode acontecer que os juízes vejam o processo por prismas diferentes, mesmo do ponto de vista jurídico, e os esforços que se façam para obter uma segunda absolvição devem consequentemente ajustar-se às circunstancias presentes e ser tão activos quanto foram os primeiros.»





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