O Processo - Cap. 10: Capítulo 10 Pág. 181 / 183

Foi então que à frente deles apareceu Fraulein Bürstner, subindo um pequeno lanço de degraus que conduzia à praça, vindo de uma rua lateral situada num plano mais baixo. Não havia a certeza absoluta de que fosse ela, mas a semelhança era bastante. Contudo, quer fosse realmente Fraulein Bürstner quer não, isso não interessava a K.; o importante foi que de repente se apercebeu da futilidade da resistência. Não haveria nada de heróico nela se ele tivesse de resistir para criar dificuldades aos seus companheiros, para procurar agarrar, lutando, a última centelha de vida. Pôs-se em movimento e o alivio que os seus guardas sentiram transmitiu-se, de certo modo, a ele próprio. Permitiam-lhe, agora, que caminhasse à sua frente e ele seguia na direcção tomada pela rapariga que o precedia, não porque a quisessem ultrapassar ou manter sob a sua vista tanto quanto possível, mas apenas para que ele não esquecesse a lição que ela lhe recordara. A única coisa que neste momento posso fazer, disse para consigo próprio, e a sua correspondência regular entre os seus passos e os passas dos outros dois confirmavam o seu pensamento. A única coisa que tenho de continuar afazer é manter a minha inteligência calma e analítica até ao fim. Quis sempre agarrar o mundo com a palma das as mãos e nunca sequer por um motivo muito louvável Então estava errado e agora terei de mostrar , que nem mesmo um processo que durou um ano me ensinou fosse o que fosse? Terei eu de deixar este mundo como um homem desprovido de senso comum? Irão as pessoas dizer de mim, depois de eu ter desaparecido, que no inicio do meu processo eu o queria encerrar e que no f m dele eu o desejava recomeçar? Não quero que digam tal Estou grato pelo facto de estas criaturas meio mudas, insensíveis, me terem sido enviadas para me acompanharem nesta viagem e de eu poder dizer a mim próprio tudo o que é necessário.

Entretanto, Fraulein Bürstner desaparecera, virando a esquina de uma rua lateral, mas nesta altura já K. podia ir sozinho, submetendo-se à direcção imposta pela sua escolta. Numa harmonia completa, à luz do luar, os três atravessaram agora uma ponte; os dois homens seguiam atentos ao mínimo movimento de K. e, quando ele se virou ligeiramente na direcção do parapeito, eles viraram-se também numa frente sólida. A agua, resplandecente e trémula sob o luar, banhava ambos os lados de uma pequena ilha, na qual a folhagem das árvores e dos arbustos brotava em espessas massas, como se fosse emolhada junta.





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