O Processo - Cap. 6: Capítulo 6 Pág. 74 / 183

Na sua precipitação, o tio de K., com a mão, indicou ao funcionário que K. o tinha chamado, o que era, sem dúvida, mais do que evidente. Em pé ao lado da secretária, K. agarrou em vários papéis e, em voz baixa, começou a explicar ao rapaz, que o escutava, serena mas atentamente, o que tinha de ser feito durante a sua ausência. Seu tio perturbava-o por se ter colocado ali ao lado dele, de olhos esbugalhados, a morder o lábio nervosamente; se bem que não estivesse realmente a escutar, a sensação de o estar a fazer tornava-se bastante incomodava. A seguir pôs-se a andar de um lado para o outro, parando aqui e ali, ou junto à janela ou em frente a um quadro, com súbitas exclamações, tais como: «Não consigo entender de maneira nenhuma» ou «Deus sabe o que ainda está para vir.» O rapaz não deu mostras de notar fosse o que fosse, ouviu calmamente até ao fim as explicações que K. lhe dava, tomou notas e partiu depois de fazer uma vénia a K. e a seu tio, que, contudo, nesse momento, tinha as costas voltadas para ele e olhava através da janela, estendendo os braços e agarrando as cortinas. Mal a porta se fechou, o tio gritou: «Até que enfim que aquele burro se foi; agora podemos ir também.» Infelizmente, K. não conseguia fazer com que o tio deixasse de fazer perguntas acerca do seu processo, mesmo no átrio principal, onde vários funcionários e contínuos se encontravam e por onde o subgerente ia a passar nesse preciso momento.

«Vamos lá, Joseph», começou o tio a dizer, retribuindo com uma rápida inclinação de cabeça as vénias dos funcionários que ali esperavam, «diz-me agora francamente que espécie de processo é esse.» K. fez umas observações nada comprometedoras, rindo um pouco, e só quando se encontravam na escadaria explicou ao tio que não quisera falar abertamente em frente dos funcionários. «Certo», respondeu o tio, «mas despeja agora isso cá para fora.» Escutava com a cabeça inclinada, puxando rápidas fumaças do seu charuto. «Há que compreender, em primeiro lugar, tio», disse K., «que não estamos perante um processo a ser apresentado a um tribunal vulgar.» «Isso é mau», volveu o tio. «O que é que o tio quer dizer?», inquiriu K., fixando o tio. «Quero dizer que isso é mau», respondeu de novo o tio. Estavam agora parados nos degraus exteriores do Banco; como o porteiro estava aparentemente a escutar o que eles diziam, K. arrastou dali o tio e em breve eram absorvidos pelo tráfego das ruas.





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