A República - Cap. 4: Capítulo 4 Pág. 111 / 290

- Com certeza que há.

- Qual? - perguntei. - E em que cidadãos se encontra?

- É - respondeu - a ciência da guarda e encontra-se nos chefes a que há pouco chamávamos guardas perfeitos.

- E, relativamente a essa ciência, como consideras a cidade?

- Considero-a prudente nas suas deliberações e verdadeiramente sábia.

- Mas - repliquei - quais são os que, na tua opinião, se encontram em maior número na cidade: os ferreiros ou os verdadeiros guardas?

- Os ferreiros, e de longe.

- Por conseguinte, de todos os organismos que tiram o nome da profissão que exercem, o dos guardas será o menos numeroso?

- De longe.

- Assim, é para a classe, para a sua parte menos numerosa e para a ciência que nela reside, é para os que estão à cabeça e governam que toda a cidade, fundada segundo a natureza, deve ser sábia; e os homens desta raça são naturalmente muito raros e a eles compete participar na ciência que, única entre as ciências, merece o nome de sabedoria.

- Está certíssimo - disse ele.

- Descobrimos assim, não sei como, uma das quatro virtudes procuradas e o ponto da cidade em que reside.

- Quanto a mim - observou - parece que a descobrimos de maneira satisfatória.

- No que se refere à coragem e à parte da cidade em que reside, parte por causa da qual a cidade é considerada corajosa, não é difícil vê-las.

- Como assim?

- Quem diria - prossegui - que uma cidade é cobarde ou corajosa tendo em consideração outra coisa que não seja essa parte da cidade que faz a guerra e pega em armas por ela?

- Ninguém - respondeu - o diria tendo em consideração outra coisa.

- Por isso, não pensei que os outros cidadãos, cobardes ou corajosos, tenham o poder de dar à cidade um outro desses caracteres.

- Com efeito, não o têm.

- Portanto, a cidade é corajosa por uma parte dela própria e porque possui nessa parte a força de conservar constantemente intacta a sua opinião sobre as coisas a temer, isto é: as que, em número e natureza, o legislador designou na educação. Ou não é a isto que chamas coragem?

- Não compreendi inteiramente o que disseste; repete-o.

- Disse que a coragem é uma espécie de salvaguarda.

- Sim, mas que espécie de salvaguarda?

- A da opinião que a lei fez nascer em nós, por meio da educação, sobre as coisas a temer, o seu número e a sua natureza.





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