Procurar livros:
    Procurar
Procurar livro na nossa biblioteca
 
 
Procurar autor
   
Procura por autor
 
marcador
  • Sem marcador definido
Marcador
 
 
 

Capítulo 9: Capítulo 9

Página 85
Fizera o que lhe parecera melhor. Em que seria a sua atitude censurável? Agora que Mrs. Sinico desaparecera, compreendia-se como a vida lhe devia ter corrido solitária, noite após noite, sozinha naquele quarto. A vida dele também seria triste até que se tornasse uma recordação, se alguém se lembrasse dele, porventura...

Já passava das nove quando deixou a loja. A noite estava fria e escura. Entrou no parque pela primeira rua e ficou a passear sob as árvores. Andou pelas mesmas áleas por onde haviam caminhado quatro anos antes. Parecia-lhe senti-la perto de si, na escuridão. Por momentos imaginava ouvir a voz dela e sentir as suas mãos tocarem-no. Parou, a fim de escutar melhor porque lhe teria roubado a vida? Porque a teria condenado à morte? Viu que a sua moral caía aos pedaços, desfeita.

Quando chegou ao cimo de Magazine Hill, parou e olhou sobre o rio. As luzes de Dublin brilhavam na noite fria. Olhou para baixo e, na sombra da parede do Parque, viu algumas figuras deitadas. Aqueles amores furtivos e venais enchiam-no de desespero. Observou a rectidão da sua existência, e sentiu que se havia privado da alegria de viver. Uma criatura humana sentira amor por ele; e ele recusara-lhe a vida e a felicidade, havia-a conduzido à ignomínia de uma morte vergonhosa. Sabia que aquelas criaturas prostradas lá em baixo, junto à parede, o espiavam, desejando que partisse quanto antes. Ninguém o queria; sentia-se privado da alegria de viver.

Volveu os olhos para o rio que serpenteava na direcção de Dublin. Lá ao longe, avistou um comboio que saía da Estação de Kingsbridge, atravessando a obscuridade. Deixou de o avistar, mas ficou ouvindo na distância as sílabas do nome dela, repercutidas no ruído do comboio. Voltou pelo mesmo caminho, sempre com esse ritmo nos ouvidos. Começou a duvidar da realidade que a memória lhe trazia. Parou debaixo de uma árvore, e esperou que a recordação se afastasse. Não podia sentir na escuridão a presença dela, nem a sua voz. Esperou mais uns minutos, escutando. Não se ouvia nada: a noite estava perfeitamente silenciosa. Tornou a escutar: silêncio completo. Nesse momento, sentiu a grandeza horrível da sua solidão.

<< Página Anterior

pág. 85 (Capítulo 9)

Página Seguinte >>

Capa do livro Gente de Dublin
Páginas: 117
Página atual: 85

 
   
 
   
Os capítulos deste livro:
Capítulo 1 1
Capítulo 2 9
Capítulo 3 30
Capítulo 4 36
Capítulo 5 52
Capítulo 6 58
Capítulo 7 63
Capítulo 8 69
Capítulo 9 78
Capítulo 10 86