O Retrato de Dorian Gray - Cap. 11: Capítulo 11 Pág. 193 / 335

Estava escrito naquele curioso estilo rebuscado, ao mesmo tempo vivo e obscuro, cheio de gíria e arcaísmos, de expressões técnicas e complicadas paráfrases, que caracteriza a obra de alguns dos mais belos artistas da escola francesa dos simbolistas. Havia nele metáforas monstruosas como orquídeas, e, como elas, subtis no colorido. A vida dos sentidos era descrita nos termos da filosofia mística. O leitor, às vezes, quase nem sabia se estava lendo os êxtases espirituais de algum santo medieval, se a mórbida confissão dum pecador moderno. Era um livro venenoso. As suas páginas pareciam impregnadas dum forte aroma a incenso, que perturbava o cérebro. A mera cadência das frases, a subtil monotonia da sua música, repleta de complexos estribilhos e movimentos complicadamente repetidos, produziram no espírito do jovem, ao passar de capítulo para capítulo, uma forma de rêverie, uma morbidez de sonho, que lhe não deixaram ver que o dia ia declinando e as sombras o iam a pouco e pouco envolvendo.

O céu sem nuvens, esverdeado, em que luzia uma estrela solitária, dava-lhe claridade através da janela. Continuou a ler a essa frouxa luz até não poder mais. Então, depois de o criado lhe haver repetidas vezes lembrado que já era tarde, levantou-se, e, indo ao quarto contíguo, pousou o livro na mesinha florentina que estava sempre à beira do seu leito e começou a vestir-se para jantar.





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